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Formação de público e acessibilidade| Museu Felícia Leirner

O Museu Felícia Leirner, em Campos do Jordão/SP, reúne esculturas da artista nascida na Polônia em 1904 e radicada no Brasil de 1927 a...

Publicado em 18/10/2016

Atualizado às 14:58 de 13/08/2017

Museu Felícia Leirner, em Campos do Jordão/SP, reúne esculturas da artista nascida na Polônia em 1904 e radicada no Brasil de 1927 a 1996, quando faleceu. Um conjunto de 85 obras – de bronze, cimento branco e granito – está distribuído ao ar livre, sobre o gramado e à beira de alamedas, no jardim do espaço que a instituição divide com o Auditório Claudio Santoro, sede do Festival Internacional de Inverno, compreendendo uma área de mata com 35 mil metros quadrados de extensão.

Na disposição das obras no espaço do jardim, a critério de Felícia, as esculturas estão agrupadas de acordo com as fases da trajetória da artista: figurativa (1950-1958), a caminho da abstração (1958-1961), abstrata (1963-1965), orgânica (1966-1970) e recortes na paisagem (1980-1982).

O Observatório Itaú Cultural esteve no museu para apresentar o documentário Música ao Lado, na programação da 10ª Primavera dos Museus – que neste ano teve a temática Museus, Memórias e Economias da Cultura –, e aproveitou a visita para conversar com Marina Falsetti, gerente do Museu Felícia Leirner, sobre formação de público, acessibilidade e outras questões. Confira.

Existe algum programa de mediação no museu?

Trabalhamos essencialmente com três temas norteadores relacionados à natureza híbrida das instituições – Museu Felícia Leirner e Auditório Claudio Santoro –, sendo eles as artes visuais, a música e o meio ambiente. O primeiro tema está diretamente relacionado à coleção de 85 esculturas da artista Felícia Leirner. Nosso acervo permanente é esse conjunto de obras exposto a céu aberto, em meio a um imenso jardim e área de proteção ambiental no alto da Serra da Mantiqueira, o que justifica, portanto, a nossa atuação com o tema do meio ambiente. A música está presente desde o surgimento do espaço, que previa, além de um museu a céu aberto, a construção de um auditório capaz de receber o já internacionalmente reconhecido Festival de Inverno de Campos do Jordão. Dessa forma, considero os nossos programas de exposições e programação cultural, educativa e de comunicação e desenvolvimento institucional como programas de mediação, no sentido de produzirem, em suas especificidades, conteúdos, ações e proposições voltadas para a abordagem qualitativa dos temas de atuação com os mais variados públicos e públicos potenciais.

Como se dá o processo de formação de público?

O processo se dá pela articulação dos vários programas estabelecidos pelo plano de trabalho firmado entre a Secretaria de Cultura do Estado e a Associação Cultural de Apoio ao Museu Casa de Portinari (Acam Portinari), por meio de contrato de gestão. É a inter-relação de cada meta pactuada no plano que permite a manutenção dos mecanismos de formação de público, no sentido de estarem todas alinhadas com essa perspectiva. A estratégia que prevê programação para todos os períodos do ano – deslocando a primazia da temporada de inverno e pulverizando ações de qualidade durante o restante do ano – busca ampliar as ofertas e atingir diferentes públicos, escapando à sazonalidade típica dos municípios turísticos, com ofertas que privilegiam majoritariamente os turistas.

O estabelecimento de séries de eventos e ações, como Encontros com Arte, Família no Museu, O Palco É Seu e Ensaio Aberto, busca a fidelização de públicos emergentes, pois, além de essas ações dialogarem com diferentes perfis de visitantes, elas são periódicas e acontecem com a regularidade necessária para que se mantenham atraentes e convidativas. Vale lembrar que o caráter múltiplo dos equipamentos culturais contribui naturalmente para o objetivo de ampliação e formação de público se explorado de forma consciente e sistemática, como estamos buscando fazer. Por fim, destacamos a implementação de ações continuadas de aproximação com os mais diferentes entes da comunidade local, com especial atenção à comunidade escolar, ao trade turístico e às instituições sociais e culturais do município e de seu entorno.

Ainda sobre a formação de público, grande parte dos visitantes do museu vem do turismo? Existe algum trabalho específico para esse público?

Turistas nos visitam desde sempre. Para esse perfil de público, o foco da gestão recai principalmente sobre a qualidade das ofertas e das interações. Assim sendo, parte significativa da programação é elaborada com o objetivo de atender o público espontâneo em oficinas, vivências e atividades que não necessitem de nenhum tipo de preparação ou preocupação prévias, tornando-as atraentes para esse perfil. Como já mencionado, a ampliação na oferta de atividades e programação para além da temporada de inverno atinge tanto o turista quanto o morador. Buscando incrementar a visitação durante esses períodos historicamente inexplorados pelo turismo local, ressaltamos a importância da constância na atualização do site e do conteúdo compartilhado nas redes sociais do museu e do auditório, como ferramenta privilegiada na comunicação com esse perfil de visitante. Vale ressaltar ainda a relação de reciprocidade que vem sendo estabelecida entre a instituição e os diversos entes do turismo local, através de mecanismos de interação variados e contínuos, estabelecidos paulatinamente desde o início da gestão. Essas interações permitem o constante aprimoramento das estratégias, pelo aprofundamento no conhecimento das características específicas do turismo local.

A missão do museu destaca a questão do patrimônio ambiental. Como a instituição trata esse conceito e quais são alguns dos trabalhos realizados nessa linha?

Estudos contratados e conduzidos pela Acam Portinari apontam a relevância e a magnitude da diversidade biológica da área em que o museu e o auditório estão sediados. Trata-se de um remanescente de Mata Atlântica importantíssimo, com grande variedade de espécies animais e vegetais, incluindo espécies raras e ameaçadas de extinção. Podemos dividir as ações, basicamente, em dois perfis distintos: de um lado, englobam a atitude consciente da própria instituição, manifestada pela atitude dos funcionários, pela tomada de decisões e pelas proposições envolvendo esse tema; de outro lado, há as ações voltadas para a educação sobre o assunto, manifestada nas atividades realizadas com o público visitante.

Assim sendo, destacamos que as tomadas de decisão incluem ponderações e perspectivas de sustentabilidade, buscando a redução dos impactos ambientais e a real conscientização das equipes internas. Treinamentos e ações de consciência funcional incluem a manutenção de mecanismos internos, como separação de lixo, compostagem e reaproveitamento de materiais. Na relação com os visitantes, é preciso considerar desde a comunicação visual voltada para o tema até as ações via internet e as atividades presenciais (oficinas, workshops e vivências) focadas no meio ambiente. Para concluir, acho bastante importante mencionar a contratação de uma empresa especializada para a elaboração de relatórios anuais de impacto ambiental, que levam em conta dados de visitação e consumo. Tais relatórios geram ações efetivas de plantio de mudas que visam à compensação da emissão de carbono no meio ambiente, minimizando, portanto, o impacto de nossa atuação.

Na programação do museu, nota-se uma política de acessibilidade – na divulgação da programação em redes sociais, por exemplo, vemos a descrição de imagens para cegos. Como o museu trata esse assunto?

Tratamos esse tema com a atenção que ele merece na contemporaneidade, buscando instrumentalizar para atender o maior número de pessoas possível, respeitando suas habilidades e suas limitações. Em termos de acessibilidade física, algumas soluções importantes já foram levadas a cabo e há outras no nosso foco de preocupação. Para pessoas com dificuldade de locomoção, existe a possibilidade de selecionar a rota mais indicada para o passeio, uma vez que todo o percurso foi avaliado e sinalizado em diferentes níveis de dificuldade. Atualmente, o projeto de acessibilidade ligado ao conteúdo inclui um audioguia, que leva o visitante cego por todo o museu, explorando obras previamente selecionadas e devidamente sinalizadas pelo percurso. Temos ainda um mapa tátil do espaço, que introduz o visitante à exposição, e uma maquete tátil contendo o museu e o auditório. Parte do conteúdo comunicacional do espaço também está disponível em braile, em pranchas táteis.

Em relação à comunicação via internet, destacamos que o nosso site possui o recurso de acessibilidade para pessoas surdas e que as imagens postadas nas redes são todas descritas, para acesso do público cego. Vale lembrar que, no plano de trabalho, há metas pactuadas para o atendimento qualitativo de pessoas com deficiência e que, nesse sentido, a equipe de educação realiza trabalhos continuados com diferentes instituições de atendimento a pessoas com deficiência na cidade, inclusive aprimorando estratégias e criando um material específico para a mediação com esse público. Para concluir, parte importante da acessibilidade é aquela conhecida como “atitudinal” – diz respeito à forma como a equipe recebe o visitante com deficiência no curso da rotina das instituições, o que nos leva ao constante aprimoramento das nossas práticas de atendimento, incluindo treinamentos específicos para as diferentes situações de apoio ao visitante.

O museu tem algum trabalho com a memória de Campos do Jordão?

Estamos trabalhando primordialmente, neste momento, o fortalecimento dos laços entre museu/auditório e a comunidade local, buscando apropriação e empoderamento. Sob essa perspectiva, algumas atividades pontuais ligadas à memória local já ganharam corpo em nossas ações e proposições e, com o fortalecimento desses laços de confiança e reciprocidade, algumas delas começam a se delinear ainda neste semestre. Esperamos obter bons frutos para compartilhar!

Em setembro, o museu participou da 10ª Primavera dos Museus, com o tema Museus, Memórias e Economia da Cultura. Fale um pouco sobre esse evento.

A Primavera dos Museus é uma proposição anual do Ibram [Instituto Brasileiro de Museus] para o engajamento de todos os museus do país. A ideia é mobilizar as instituições na elaboração de um calendário especial para o período, buscando fomentar discussões e reflexões pertinentes ao universo dos museus. A cada novo ano, o Ibram lança um tema articulador para esse evento, em torno do qual a programação de cada instituição deverá ser trabalhada livremente, respeitando suas especificidades.

Para a décima edição, que aconteceu entre os dias 19 e 25 de setembro deste ano, o tema proposto foi Museus, Memórias e Economia da Cultura. Pela nossa percepção, esse tema, além de bastante amplo, buscou incitar a reflexão sobre o importante papel dos museus como articuladores sociais, capazes de promover trocas significativas e contribuir para a preservação da memória local, regional e nacional, bem como para a promoção da cultura nos locais onde estão inseridos. A inclusão da ideia de economia da cultura nesse contexto, além de bastante atual, incentiva a possibilidade de compreensão da cultura através de perspectivas ainda pouco exploradas e, por vezes, polêmicas, marcando o lugar do museu como espaço privilegiado para a prática do debate e de trocas significativas.

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Marina Falsetti, licenciada em história pela Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), atua em museus e instituições culturais desde a sua formação. Iniciou sua carreira profissional como educadora em diferentes museus e exposições temporárias em 2005, tendo atuado e contribuído em pesquisas para material educativo e na supervisão de equipes educativas. Integrou o Núcleo de Educação Cultural do Instituto Itaú Cultural de 2007 a 2009, supervisionando a equipe de educadores do Museu de Numismática. Faz parte da equipe da Associação Cultural de Apoio ao Museu Casa de Portinari desde 2013, em que responde pela gerência-geral do Museu Felícia Leirner e do Auditório Claudio Santoro.

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