4

Calder e o neoconcretismo brasileiro

 CONTEXTUALIZAÇÃO

Como a obra do escultor norte-americano influenciou um dos mais importantes movimentos da arte moderna brasileira dos anos 1950.

 

A presença de Alexander Calder no Brasil coincide com um momento singular da história da arte no país. Entre a sua primeira exposição – no Salão de Maio, em 1939 – e a sua grande individual, em 1948, levando em conta ainda sua presença em mostras importantes ao longo dos anos 1950, as artes visuais brasileiras viveram um período de profundas transformações.

 

Foi o momento de consolidação da arte moderna e da ascensão do abstracionismo. Uma época de modernização do mercado e das instituições, com a abertura de grandes museus – o Museu de Arte de São Paulo (Masp), em 1947, e o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM-Rio), em 1948, – e a realização das primeiras bienais de arte. Uma época de intercâmbio cultural cada vez maior com a Europa e os Estados Unidos e de grande efervescência criativa e renovação estética.

 

Muito dessa renovação foi marcada pela influência de Calder. O interesse do escultor por materiais industriais, como o metal e o arame, o uso de formas puras e geométricas e a negação da representação em nome da criação de um universo artístico autônomo ecoaram em um movimento que tomava forma no início dos anos 1950 no Brasil: o neoconcretismo

 

A escola artística que ganhou força no Rio de Janeiro com o Grupo Frente reunia artistas diretamente ligados a Mário Pedrosa. O crítico de arte foi um dos principais divulgadores do trabalho de Calder no Brasil e extremamente influente para aquela geração de artistas que despontava nos anos 1950.

 

Lygia Clark, Lygia Pape, Hélio Oiticica, Willys de Castro, Abraham Palatnik – todos representados em Calder e a Arte Brasileira – incorporaram na experiência neoconcreta

muito do que o crítico observou no trabalho de Calder: uma abstração pautada na subjetividade, que aliava

construção e expressão, humor e mecânica, características bem diferentes daquele projeto concreto do Construtivismo, racionalista por excelência. “A filiação de Pedrosa ao abstracionismo de Calder terá plausivelmente influenciado o rumo singular do grupo carioca”, observou Roberta Saraiva no livro Calder no Brasil (Cosac Naify, 2006).

 

Também em São Paulo o norte-americano marcou os concretos. O pintor e escultor Luiz Sacilotto, integrante do Grupo Ruptura, trabalhou em 1946 no escritório de Jacob Ruchti, arquiteto modernista entusiasta do trabalho de Calder, e passou a aderir ao abstracionismo. Caminho seguido também pela artista visual Judith Lauand, única mulher a integrar o grupo concreto paulistano.

 

Arte e vida

O neoconcretismo é considerado por parte da crítica como o grupo que, de certa forma, inaugura a arte contemporânea no Brasil, na medida em que suas obras propõem uma “fusão da arte com a vida”, pressupondo um papel mais ativo do espectador e experiências sensoriais. Essas características foram ressaltadas também por Mário Pedrosa na obra de Calder, cuja arte, segundo o crítico, “seria confundida com as atividades da rotina diária e a prática cotidiana de viver”. (Mário Pedrosa: Forma e Percepção Estética – Textos Escolhidos, Edusp, 1995.)

 

É nesse contexto de expansão dos horizontes e de consolidação do circuito de artes, com abertura de novos museus e galerias a partir dos anos 1960, que estão artistas como Waltercio Caldas, Ernesto Neto, Carlos Bevilacqua e Cao Guimarães. Herdeiros em maior ou menor grau do legado neoconcreto, eles radicalizam a experiência sensorial e a fusão entre arte e vida.

 

Letícia Ramos

 

2016 - DESENVOLVIDO PELA CONTEÚDO COMUNICAÇÃO