Oi D. Maria,

 

Hoje me deu uma vontade de ir a sua casa fazer uma aula. Lembrei que a senhora está viajando e eu então inventei um lugar, uma Torre de Água onde meus pensamentos penetram e assim podemos conversar, conversar sobre as tantas coisas que vamos vivendo.

 

Eu então a imagino flutuando sobre o mar olhando em volta e torcendo muito pela gente, essas e esses que saem voando pela vida fazendo as artes de criar, viajar e realizar!

 

A senhora aí nesta Torre e eu aqui pensando no HiperCubo do Laban! Acredita? Ando tendo um monte de insights! Prazeres de uma mente especulativa. Queria mostrar umas coisas, refletir aí no cantinho onde a senhora fica olhando nossas danças.

 

Mas hoje me deu essa vontade de ir até aí dançar! E então eu me perguntei por que não danço? Esqueci alguma coisa?

 

Os tempos são outros e meus olhos estão vendados do entristecer. Não há mais descanso nessa alma atormentada que estou. Lembrei da sua sala de dança. Um lugar para Ser sem medo, corações guerreiros, inquietos e persistentes.

 

Queria lhe dizer que não, não foi em vão que senti despertar por suas mãos esse coração poeta sempre na corda bamba.

 

Esse existir pela metade que nunca vai se completar. Hoje, sua ausência me tornou de assalto, minha existência e meu corpo precisam da cura na simples sinceridade do seu sorriso. Quando a gente terminava uma aula e a senhora dizia “Que lindo!” e aí nos descrevia as maravilhas de nossas danças, levantava tantas possibilidades que a vida parecia infinita.

 

Se eu pudesse ir até sua casa hoje acender de novo a chama do prazer ocioso da dança!

Mas você partiu, foi para sua Torre de Água, mergulhada no azul das ondas que a embalam. Com a imaginação e sentimento posso ouvir o sussurro da maré e sentir seu olhar aquecido de amor e aventura!

Com amor

 

Maria

 

 

[Maria Mommensohn é bailarina, coreógrafa e pesquisadora na área da antropologia da dança formada por Maria Duschenes e no Laban Center de Londres (One Year Course, 73/74) e como pedagoga pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. É mestre em Artes pela Unicamp em 2004 com o espetáculo MBOCHY e dá aulas na Escola Municipal de Bailados de São Paulo desde 1989.Entre prêmios diversos e outras atividades ligadas à dança, criou e organizou os Encontros Laban em 1989, 1992, 1996 e 1999. Atualmente desenvolve o projeto OcO apresentado no Teatro de Dança de São Paulo e galeria Olido, entre outros.]

 

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