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Quando a moderna arquitetura brasileira deu os primeiros passos para ganhar o mundo

A presença de arquitetos estrangeiros no Brasil e a exposição sobre arquitetura brasileira no MoMA foram essenciais nesse processo

Publicado em 26/03/2020

Atualizado às 10:25 de 04/05/2022

por Cassiano Viana

É da maior importância para a arquitetura brasileira as passagens pelo Brasil do franco-suíço Le Corbusier e do norte-americano Frank Lloyd Wright, considerados dois dos mais importantes arquitetos do século XX.

Le Corbusier em 1929 realizou conferências em São Paulo e no Rio de Janeiro e em 1936 supervisionou, a convite do então presidente, Getúlio Vargas, a construção do edifício da nova sede do Ministério da Educação no Rio de Janeiro – hoje Edifício Gustavo Capanema.

Convidado para integrar o júri de um concurso internacional de arquitetura, Frank Lloyd Wright desembarcou no Brasil em 1931 e permaneceu três semanas no Rio de Janeiro, convivendo com Lucio Costa e Gregori Warchavchik e publicando em jornais do Rio uma série de artigos em prol de uma nova arquitetura.

A presença, no início do século passado, desses dois arquitetos estrangeiros influenciaria os profissionais brasileiros e colocaria o país no radar da arquitetura internacional.

O Brasil se mostrava um território propício para arquitetos estrangeiros. O modernismo que já se instalara no Brasil formalmente durante a Semana de Arte Moderna ganhava amplitude com a presença dessas e de outras personalidades. Assim como o processo de industrialização.

Após as visitas de Le Corbusier e Frank Lloyd Wright, dois outros acontecimentos projetariam internacionalmente a nova arquitetura brasileira.

Em 1939, o pavilhão brasileiro na Feira Mundial de Nova York, projetado por Lucio Costa e Oscar Niemeyer, foi considerado, por público e imprensa, um dos pontos altos da exposição. Para muitos, a repercussão positiva da crítica internacional ajudou a alavancar a carreira dos dois arquitetos, antes da construção de Brasília.

E aqui cabe a história: patrocinador responsável pela participação brasileira na feira, o Ministério do Trabalho realizou um concurso para a escolha do melhor projeto, o qual teve Lucio Costa como vencedor. Ao saber que o segundo lugar ficara com Niemeyer, Costa renuncia a ideia original e propõe um projeto conjunto com Niemeyer, que lembra o fato em suas memórias:

"Quando Lúcio soube que fora classificado em primeiro lugar e eu em segundo, abalou-se serra abaixo – estava em Petrópolis – para ver os projetos e achando o meu trabalho muito bom procurou o ministro João Carlos Vital, dele conseguindo que viajássemos para os Estados Unidos e juntos elaborássemos o projeto definitivo. Esse, aliás, constitui o único projeto que recordo com certo constrangimento, convicto de que me deveria ter limitado a ajudar o desenvolvimento do seu projeto sem procurar influir na solução. Conforta-me um pouco saber que no projeto apresentado prevaleceu sua ideia inicial, os ‘pilotis’ e o partido mais vazado que se impunha. Eu era jovem e a arquitetura, para mim, uma atração incontrolável".

Capa do catálogo da exposição Brazil Builds, Architecture New and Old, 1652-1942, realizada pelo MoMA. (imagem: G. E. Kidder Smith/retirada do catálogo Brazil Builds, Architecture New and Old, 1652-1942)

Exposição no MoMA

A arquitetura moderna brasileira estava, afinal, materializada aos olhos estrangeiros, faltando apenas um primeiro documento, uma primeira publicação que a consagrasse internacionalmente.

Essa publicação foi o catálogo da exposição Brazil Builds, Architecture New and Old, 1652-1942, inaugurada em 1943 – cerca de quatro meses após o Brasil ter declarado guerra à Alemanha e à Itália – no Museu de Arte Moderna (MoMA).

A mostra, que exibiu a arquitetura brasileira, moderna e antiga para o mundo, apresentava construções de 12 estados – Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Espírito Santo, São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Bahia, Pernambuco, Paraíba, Ceará, Amazonas e Pará –, indo da arquitetura religiosa e edificações rurais de cunho produtivo, como os engenhos e as fazendas de café, ao que vinha sendo construído no país na época, como o edifício do Ministério de Educação e Saúde.

O arquiteto Philip Goodwin, coautor do projeto do prédio do MoMA e então presidente do departamento de arquitetura do museu, foi personagem importante na organização da mostra, junto com o arquiteto inglês George Everard Kidder Smith. Juntos, os dois viajaram para o Brasil com a missão de colher dados sobre a arquitetura brasileira.

"O Museu de Arte Moderna, de Nova York, e o Instituto Norte-Americano de Arquitetos, achavam-se ambos, na primavera de 1942, ansiosos por travar relações com Brasil, um país que ia ser nosso futuro aliado. Por esse motivo e pelo desejo agudo de conhecer melhor a arquitetura brasileira, principalmente as soluções dadas ao problema do combate ao calor e aos efeitos da luz sobre as grandes superfícies de vidro na parte externa das construções, foi organizada uma viagem aérea", escreve Goodwin, no catálogo da exposição. "G. E. Kidder Smith, arquiteto, acompanhou-me para tomar vistas e aspetos arquitetônicos", conta.

Em dois meses de viagem foram produzidas quase mil fotografias e colecionadas imagens dos arquivos do Instituto de Arquitetos do Brasil e do SPHAN, desenhos originais de Niemeyer, impressões e fotografias de vários outros esboços de desenhos, entre outros materiais.

Além das fotografias de G. E. Kidder Smith, foram adquiridos registros de Marcel Gautherot e de Eric Hess, entre outros fotógrafos brasileiros.

O catálogo da exposição, que abriu caminho para a divulgação da moderna arquitetura brasileira fora do país, não só nos Estados Unidos, mas na Europa, é até hoje um livro de referência para muitos arquitetos e pesquisadores.

"É um esforço para mostrar aos norte-americanos o encanto das velhas e a inspiração das novas construções no Brasil. Também outros muitos latino-americanos podem não estar familiarizados com esta face da cultura dos nossos vizinhos brasileiros. E estes fatos justificam o esforço", conclui Goodwin, no texto de apresentação da publicação.

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