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Rumos 2013-2014: Um Prédio Gigantesco sob o Olhar do Cinema e da Arte

Homenagem a Matta-Clark selecionados: Joana Traub Csek ö e Pedro Urano Em 2008, a artista visual Joana Traub Csekö realizou a série HU...

Publicado em 19/02/2015

Atualizado às 21:05 de 02/08/2018

obra: Homenagem a Matta-Clark
selecionados: Joana Traub Csekö e Pedro Urano

Em 2008, a artista visual Joana Traub Csekö realizou a série HU. Durante a inauguração de seu ateliê, em uma das paredes estavam expostas fotos desse seu recente trabalho que trazia como foco o HU, hospital universitário da UFRJ localizado no campus da Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro.

Amigo desde os tempos da faculdade de comunicação, o cineasta Pedro Urano se impressionou com as imagens e a convidou para fazer um filme. A ideia era investigar o mistério daquele prédio de 220 mil metros quadrados de área construída, com exatamente metade de toda essa estrutura de concreto armado jamais usada. Era quase um Maracanã inteiro (o estádio tem 124 mil metros quadrados de área construída) nunca concluído integralmente. “Perna seca” foi como esse espaço abandonado ficou conhecido.

“Não havia nada nas fotos além do prédio, seus espaços vazios, mas as imagens sugeriam movimento – claramente continham muita história”, destaca Pedro. Esse “enigma” do HU já vinha sendo estudado por Joana há algum tempo como parte de sua tese de mestrado em linguagens visuais pela Escola de Belas Artes da UFRJ. A especialização era realizada ali no Fundão e foi naquele momento que a artista passou a refletir sobre o lugar. “É um campus que até hoje que não está terminado, um lugar que é meio construção, meio ruína”, pontua. O HU é o primeiro prédio do campus e foi projetado pelo arquiteto Jorge Moreira para ser o maior hospital da América Latina.

Ao começar suas pesquisas, Joana descobriu que, embora muitos acreditem que seja uma obra da ditadura militar, a construção foi idealizada ainda no primeiro mandato de Getúlio Vargas (1930‒1945), mas teve início apenas em 1950. Interrompido com o suicídio de Vargas e pela mudança da capital federal para Brasília, o projeto foi recuperado no governo militar e concluído em 1978. Nesse período chega-se à conclusão de que os 220 mil metros quadrados eram um exagero para um hospital. E se decide ocupar apenas 110 mil metros quadrados de toda a área total. A outra metade, espelhada, vira a “perna seca”.

“As imagens (da Joana) exploravam as linhas de fuga e o ritmo característico da arquitetura modernista. No entanto, revelavam um edifício arruinado. Essa ideia de uma ruína modernista, de uma forma antecipadora de um futuro, me seduziu”, revela Pedro.

Juntos, eles desenvolvem o filme HU. A proposta do longa é trazer a dimensão humana do prédio por meio da relação de médicos, diretores, alunos, pacientes com toda aquela estrutura, especialmente com a metade abandonada. Joana destaca que para as pessoas envolvidas com o HU era como se a “perna seca” não existisse, embora estivesse separada do hospital, muitas vezes, apenas por uma porta. Veja o trailer aqui.

Curta-metragem

A história, porém, não termina aí. Ela continua e gera um novo projeto: um curta-metragem em homenagem ao artista americano Gordon Matta-Clark.

Após um ano e meio mergulhados no HU, Joana e Pedro já estavam finalizando o filme quando receberam a notícia: a “perna seca” seria implodida. Houve um abalo estrutural e a metade abandonada não tinha mais como ser mantida. E eles precisavam registrar esse momento.

O processo de implosão não seria simples. Era preciso antes separar as metades. Desde o início do filme, o trabalho de Matta-Clark foi uma referência para Joana e Pedro. Ao ver o prédio sendo fatiado daquela forma, em cortes precisos, ficou ainda mais evidente a alusão à obra do artista. “A produção de Matta-Clark – célebre por suas intervenções arquitetônicas como cortes, secções e subtrações feitas em edificações abandonadas – foi fundamental para melhor entendermos como desconstruir e ressignificar a arquitetura do HU. Agora, víamos nosso edifício espontaneamente se transformar na maior ‘obra’ já vista de Matta-Clark, desta vez tendo como matéria o concreto armado de uma construção moderna”, explicitam.

Assim surgiu a ideia de fazer um curta-metragem com foco nisso. A implosão também está no longa, como um epílogo, mas é no curta que eles exploram a parte estética do processo.

Joana e Pedro ficaram mais seis meses envolvidos com a divisão do HU, já tendo como inspiração os filmes-registro das obras de Matta-Clark, como Splitting e Conical Intersect. Por isso, a câmera e o olhar são completamente diferentes do que foi feito no longa. “É mais a ideia de estar dentro da obra, daquilo que está se desfazendo. De focar mais realmente nesse acontecimento estético”, conclui Joana. Com apoio do Rumos, mais um projeto que nasce de uma obra abandonada será agora concluído.

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