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Penitência e religiosidade são tema de livro de fotografias contemplado pelo Rumos 2017-2018

O projeto é resultado de 17 anos de pesquisa acompanhando 203 grupos ligados à Ordem dos Penitentes, em 13 estados brasileiros

Publicado em 05/07/2019

Atualizado às 11:49 de 17/08/2022

por Ana Luiza Aguiar

A busca pelo sagrado sempre fez parte da vida do fotógrafo paraense Guy Veloso. Suas primeiras lembranças desse encantamento são de assistir, ainda criança, à passagem do Círio de Nazaré em frente à casa da sua avó em Belém. Há mais de 20 anos, Veloso vem registrando a religiosidade popular brasileira, fotografando desde ritos de religiões de matrizes africanas até romarias e cultos católicos. “O que começou como uma busca apenas estética mudou, evoluiu. Passei a me encantar com a história dessas pessoas e com a resistência cultural desses grupos”, conta.

O seu projeto Penitentes, contemplado pelo programa Rumos Itaú Cultural 2017-2018, é resultado de 17 anos de pesquisa acompanhando 203 grupos ligados à Ordem dos Penitentes, em 13 estados brasileiros. Os penitentes, também chamados de “encomendadores das almas”, são grupos de pessoas místicas que se encontram espontaneamente (muitas vezes, porém, de forma secreta) e que, em certas épocas do ano, saem à noite rezando pelo que chamam de “espíritos sofredores”. Nessas noites, eles visitam cemitérios, capelas e locais onde houve mortes violentas para rezar pelas almas dessas pessoas. Cada grupo tem tradições e ritos próprios, mas todos usam vestimentas específicas e geralmente ocultam a identidade dos seus membros com mantos ou capuzes. Em alguns grupos, o ritual também envolve autoflagelação.

A dedicação de Veloso a registrar a história desses grupos acabou sendo reconhecida por um deles. A chefa do grupo De Trás da Banca, de Juazeiro (BA), Jesulene Ribeiro, conhecida como Dona Nenezinha, considera o fotógrafo membro da congregação. Contudo, esse reconhecimento veio acompanhado de direitos e deveres, explica Veloso: “Se por um lado me é permitido participar de cultos fechados, eu também sou obrigado a obedecer às determinações de Dona Nenezinha sempre que estou em Juazeiro”.

O fotógrafo conta que, apesar de as pessoas que pertencem a esses grupos quase sempre se declararem católicas, ele encontrou diversos sinais de sincretismo velado ao acompanhar esses rituais. Desde paradas predeterminadas para rezar em sete locais, que muitas vezes ficavam em encruzilhadas, até relatos de psicofonia e vidência. A crença na presença de espíritos, e na influência deles sobre os vivos, está presente em praticamente todos os 203 grupos por ele pesquisados. “Esse sincretismo se tornou mais evidente para mim em 2017, quando fotografei um ritual de encomendação das almas em um terreiro de umbanda na periferia de Belo Horizonte (MG)”.

O fotógrafo Guy Veloso | foto: Joyce Nabiça

Por meio do programa Rumos, Veloso vai publicar o primeiro livro de fotografias brasileiro que aborda esse tema com abrangência nacional. “Há livros publicados sobre grupos de penitentes de cidades específicas. Mas eu fui o primeiro a comprovar, com a minha pesquisa, que eles estão em todas as regiões do Brasil”, explica o fotógrafo. A obra terá a curadoria de Rosely Nakagawa e será editada pela Tempo d’Imagem.

A pesquisa de Guy Veloso sobre os penitentes já lhe rendeu duas exposições: a primeira, em 2010, na 29a Bienal de São Paulo, e a segunda durante a 4a Bienal das Américas, em Denver, nos Estados Unidos, em 2017. Dono de um dos maiores bancos de imagens sobre religiosidade brasileira, Veloso participou de mais de 150 exposições. Suas obras fazem parte do acervo do Museu de Arte de São Paulo (Masp), do Museu de Arte do Rio de Janeiro (MAR), da Essex Collection of Art from Latin America, na Inglaterra, e da Coleção Nacional de Fotografia do Centro Português de Fotografia, em Portugal, entre outras instituições.

 

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