Festas juninas em cidades do Nordeste e do Norte, apesar das diferenças entre si, têm o boi como a grande estrela
Publicado em 06/06/2023
Atualizado às 03:00 de 11/05/2025
A série Festas populares do Brasil, do Itaú Cultural (IC), destaca a diversidade, a cultura e a tradição das celebrações típicas do país. Nesta edição, Fernanda Castello Branco escreve sobre o São João em São Luís (MA) e sobre o Festival folclórico de Parintins (AM).
por Fernanda Castello Branco
Se é tempo de São João em São Luís, capital do Maranhão, e em Parintins – cidade a 369 quilômetros de Manaus –, ambas ilhas, pode ter certeza de que o boi é a grande estrela. Apesar de muitas diferenças estruturais separando as festas nas duas cidades, esse é o maior ponto em comum. A capital maranhense, aliás, assim como todo o estado, tem muitas características geográficas, climáticas e culturais semelhantes à vizinha Região Norte.
Mesmo que o boi seja a atração principal em ambas as cidades, as semelhanças praticamente param por aí. No próprio site oficial do Festival folclórico de Parintins, é explicado que ele é “uma variação do bumba-meu-boi do Maranhão, que no Amazonas ganhou características próprias, incorporando as lendas e rituais das etnias indígenas e da cultura popular da Amazônia”.
Os termos para se referir à apresentação que reúne encenação, dança e música também são diferentes. No Amazonas e em alguns outros estados do Norte, é boi-bumbá. Já no Maranhão, é bumba meu boi. A história é a mesma: um casal de trabalhadores de uma fazenda, Mãe Catirina e Pai Francisco, vive a aventura de roubar o boi favorito do patrão, porque, grávida, Catirina desejou comer a língua do animal. Ao sentir falta do boi, o fazendeiro coloca todos os empregados para procurá-lo na floresta. Como o encontram morto, um pajé é chamado para realizar o milagre da ressurreição.
Apesar do mesmo auto, uma diferença marcante é que, em Parintins, as apresentações acontecem com venda de ingressos e disputa de título entre os participantes. No Festival folclórico de Parintins, apenas dois bois disputam a festa, o que reforça muito a concorrência entre eles. O azul do Caprichoso versus o vermelho do Garantido: isso movimenta a economia do município.
Lançada em março deste ano, em uma cerimônia no Teatro Amazonas, a 56a edição do evento deve receber mais de 100 mil pessoas na cidade (ao longo dos últimos 20 anos, a festa já arrastou cerca de 1 milhão de pessoas para a ilha de Parintins). Para manter sua grandiosidade, recebeu verba de 10 milhões de reais, sendo metade do valor para os bois-bumbás Caprichoso e Garantido. Os temas de 2023 serão “O brado do povo guerreiro”, do Caprichoso, e “Garantido por toda vida”, do oponente.
Bumbódromo
Como o Carnaval carioca na Marquês de Sapucaí, em Parintins o local da festa é o Bumbódromo – em alusão ao Sambódromo –, arena criada em 1988 e que tem um formato que lembra a cabeça de um boi. Divididas ao meio, nos dias do evento as torcidas, chamadas de “galeras”, ficam em completo silêncio no momento da apresentação do boi adversário.
Os jurados vêm de outros estados e os nomes ficam sob sigilo até o dia da festa. Eles têm a tarefa de julgar 21 itens, analisando, entre outros detalhes, as toadas, as alegorias e os personagens de cada agremiação.
Os ingressos para 2023 – a festa acontecerá nos dias 30 de junho, 1o e 2 de julho – estão esgotados. E não são baratos. Os passaportes para as três noites (não há venda avulsa) variam de 980 a 1.495 reais.
A analista de e-commerce Mariah Campos mora em Piracicaba (SP) e vai ao Festival folclórico de Parintins neste ano. Ela já morou no Amazonas, mas é a primeira vez que vai realizar o sonho de assistir ao evento. “Sou Caprichoso desde criancinha, mas era um ‘rolê’ meio difícil de ir com minha mãe quando eu era mais nova e, quando mudei de lá, tornou-se mais difícil, porque ficou ainda mais caro”, explica.
Para conseguir realizar esse sonho, Mariah ficou, junto com uma amiga, acompanhando o Instagram da empresa que vende os ingressos e, assim que as vendas foram liberadas, elas os compraram. “Mesmo se tivesse esgotado, no festival existe a opção de ir de ‘galera’, que é a parte da torcida que não precisa pagar. Você só tem que ficar na fila e conseguir entrar. Eu já tinha dito que, se não conseguisse ingresso, neste ano iria mesmo de galera”, conta.
Como tem alguns amigos que já foram ao evento, Mariah sabe bem que o clima do Festival folclórico de Parintins é como o do Carnaval. “Assisto às apresentações todo ano, estou animada para ver a energia da galera e das apresentações. As toadas deste ano estão muito boas e, se formos usar as alegorias do ano passado como comparação, este ano vai ser gigante”, afirma.
“O maior São João do mundo”
No começo de maio de 2023, o governo do Maranhão apresentou a operadores de turismo e agentes de viagem em São Paulo (SP) o que chamaram de “o maior São João do mundo”. No dia 30 de maio, o lançamento se deu em São Luís, na presença do governador Carlos Brandão, de autoridades, políticos e produtores culturais.
O título de “o maior do mundo” foi justificado pela duração: serão 60 dias de festa, com o primeiro dia oficial em 4 de junho, no Arraial do Ipem, e mais de 1.200 atrações, entre grupos de bumba meu boi dos mais diversos sotaques (matraca, zabumba, orquestra etc.), tambores de crioula, quadrilhas juninas, shows musicais e grupos alternativos, além de danças típicas do folclore maranhense. A expectativa do governo estadual é que pelo menos 200 mil pessoas desembarquem para as festas juninas maranhenses.
Tradicional em São Luís, o Arraial do Ipem terá atrações até o dia 9 de julho, diariamente. No ano passado, segundo a coordenação do evento, cerca de 20 mil pessoas passaram por lá. Outros arraiais com longa duração serão o da Praça da Fé, Vila Palmeira e Cohatrac, com a programação indo de 8 a 25 de junho, sempre de quinta-feira a domingo.
Os outros espaços oficiais dos festejos juninos em São Luís serão Ceprama, Anjo da Guarda, Vila Embratel, Parque da Juçara, Liberdade, Cidade Operária e Maiobão, além da Capela de São Pedro (Festa de São Pedro, de 28 para 29 de junho) e João Paulo (Festa de São Marçal, no dia 30 de junho). Entre as novidades deste ano estão os arraiais que serão montados nos municípios de Imperatriz (o segundo maior do Maranhão), Pinheiro, Barreirinhas e Timon.
Antes mesmo do início oficial, os festejos maranhenses contaram com as prévias, que começaram no dia 7 de maio. Batizada de Maranhão de reencontros, a programação aconteceu durante todos os domingos de maio, na Concha Acústica Reynaldo Faray, na Lagoa da Jansen, em São Luís. Também no mês passado aconteceu o Cortejo junino, que reuniu vários grupos folclóricos seguindo pelas ruas do Centro da capital maranhense, inclusive pelas vias mais movimentadas do comércio local.
A Praia Grande, no centro histórico de São Luís, está com as principais ruas decoradas com bandeirinhas juninas. Outros locais da cidade também ganharam decoração alusiva ao São João, como a Praça dos Pescadores, a lateral da Casa do Maranhão e o portal de entrada da cidade.
São João maranhense como inspiração
João Belfort é o criador e o responsável pela marca de roupas Moda do João. A importância do bumba meu boi no Maranhão extrapola os arraiais e, neste ano, chegou a uma coleção idealizada por ele. O Boi da Floresta, da cidade de São João Batista, localizada na Baixada Maranhense, é o grande homenageado das roupas criadas por Belfort mais recentemente.
“Já tinha feito coleções antes homenageando o São João em si, mas sem trabalhar com bordados. Como conhecia o Boi da Floresta, de onde fui brincante um ano, tinha muita vontade de homenageá-los diretamente”, conta Belfort, que dançou como cacique no grupo e, mesmo depois de não participar mais, continuou indo a ensaios. A coleção traz as cores do Boi da Floresta, rosa e verde, e bordados também foram usados. As peças são camisas, calças, shorts, macacões, saias e tops.
Nascido em São Luís no mês de junho, Belfort é um apaixonado pelos festejos juninos da sua cidade natal. “Não conheço outras festas juninas, mas a do Maranhão eu não sei nem explicar. Tem que ter essa experiência. Não é só uma festa, existem muitos outros significados, como a nossa devoção aos santos. O mês de junho tem uma energia única de celebração”, define o estilista.
Calendário das festas juninas no Maranhão
Ipem – de 4 de junho a 9 de julho (diariamente)
Ceprama – de 8 a 18 de junho (de quinta-feira a domingo)
Vila Palmeira – de 8 a 25 de junho (de quinta-feira a domingo)
Cohatrac – de 8 a 25 de junho (de quinta-feira a domingo)
Anjo da Guarda – de 8 a 18 de junho (de quinta-feira a domingo)
Praça da Fé – de 8 a 25 de junho (de quinta-feira a domingo)
Liberdade – de 9 a 24 de junho (de sexta-feira a domingo)
Vila Embratel – de 15 a 25 de junho (de quinta-feira a domingo)
Cidade Operária – de 15 a 25 de junho (de quinta-feira a domingo)
Maiobão – de 15 a 25 de junho (de quinta-feira a domingo)
Parque da Juçara – de 16 de junho a 2 de julho (de sexta-feira a domingo)
Capela de São Pedro – de 24 a 29 de junho
São Marçal – 30 de junho
Imperatriz – de 30 de junho a 2 de julho
Pinheiro – de 14 a 16 de julho
Timon – de 21 a 23 de julho
Barreirinhas – de 28 a 30 de julho