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CineAula IC Play #8: A memória entre o afeto e a imaginação

A oitava sequência didática do projeto “CineAula IC Play” aborda o curta-metragem “Napo”, de Gustavo Ribeiro

Publicado em 10/11/2025

Atualizado às 14:25 de 11/11/2025

CineAula IC Play – 1a edição
Luz, câmera, educAção:
o streaming gratuito do cinema brasileiro na sala de aula

 

por Silas Silva

Sequência didática #8: A memória entre o afeto e a imaginação

Ficha técnica

 

Filme: Napo (Paraná, 2020)
Direção: Gustavo Ribeiro
Roteiro: Gabriela Antonia Rosa e Gustavo Ribeiro
Argumento: Daniel Freire, Gabriela Antonia Rosa, Gustavo Ribeiro e Thais Peixe
Produção: Gustavo Ribeiro e Thais Peixe
Direção de arte: Giovani Kososki e Rayner Alencar
Produção executiva: Thais Peixe
Direção de produção: Bruna Bastos e Thais Peixe
Assistência de direção: Bruna Bastos e Renan dos Passos
Supervisão de CG: Giovani Kososki
Supervisão de animação 2D: Daniel Freire
Supervisão de animação 3D: Christian Weckl, Felipe Iglesias, Gustavo Ribeiro e Hannry Pschera
Edição: Victor Spadottto
Classificação indicativa: livre
Gênero: animação
Sinopse: No curta-metragem dirigido por Gustavo Ribeiro, Napo é um senhor acometido por Alzheimer que, com o deterioramento da memória, perde autonomia e passa a viver com sua filha Lenita e o neto João. Nesse novo ambiente, em uma configuração familiar distinta, mais que dividir o espaço, os três acabam por (re)criar lembranças como quem brinca junto. Uma obra emocionante, que aborda temas difíceis com ternura e delicadeza.

I. TRAILER PARA QUEM EDUCA

Caro professor e cara professora,

Pensemos nestas situações: Lúcia dá aula de língua portuguesa na Escola Estadual Carolina Maria de Jesus; Jéssica está se preparando para o vestibular; secundaristas colocam-se contrários ao fechamento de colégios. Mais do que circunstâncias, essas são cenas, respectivamente, da série Segunda chamada (2019-2021), do longa Que horas ela volta? (2015) e do documentário Escolas em luta (2017). Todas elas unem contextos de aprendizagem ao audiovisual criado no nosso país. As câmeras colaboram para discussões e imaginários acerca da educação no Brasil – em diferentes fases, com diferentes sujeitos. Mas por que começar esta conversa assim, recuperando takes? A razão nada tem de complicada: o que queremos mesmo é falar dessa combinação entre os fazeres cinematográfico e educacional, essência do novo projeto do Itaú Cultural (IC).

Com a intenção de aproximar o cinema da Educação Básica, estimulando o letramento audiovisual e a valorização das produções nacionais, apresentamos o CineAula IC Play. A cada mês, vocês podem conferir, aqui no site do IC, sequências didáticas baseadas em conteúdos disponíveis na IC Play, a nossa plataforma de streaming gratuita. Esta iniciativa busca oferecer ferramentas para a aplicação da Lei no 13.006/2014 – a qual obriga a exibição de filmes brasileiros nas escolas básicas –, entendendo, ainda, que a fruição estética e crítica corresponde a um direito e um componente fundamental do processo formativo e cidadão.

Os exercícios propostos, vale salientar, estão em consonância com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e com o seu complemento, que aborda a área da computação. E, em alguns casos, as tarefas podem suscitar debates sobre inteligência artificial (IA) em aula (tudo em conformidade com a Lei no 15.100/2025, que proíbe o uso de aparelhos eletrônicos portáteis em sala, exceto quando utilizados para fins estritamente pedagógicos ou didáticos, sob orientação de educadores)

As atividades aparecem divididas em tópicos, cujas denominações remetem a termos do audiovisual, incorporando essas expressões ao nosso vocabulário. Esta parte, por exemplo, é como um trailer; depois, há o plano-sequência e os bastidores, vejam só. Fora isso, saibam que todas as produções selecionadas para o CineAula IC Play estão licenciadas para exibição em ambientes escolares. Logo, fiquem à vontade para assistir às indicações com os alunos.

Esta sequência didática foi elaborada a partir do curta-metragem de animação Napo (2020), que participou de mais de 60 festivais nacionais e internacionais e recebeu mais de 20 prêmios. Na obra, Lenita, uma mãe solo que vive com seu filho, João, acolhe seu pai, Napo, um idoso que sofre de Alzheimer. A angústia e o estranhamento iniciais, diante do esquecimento causado pela enfermidade, se transformam em afeto e cumplicidade após as intervenções de João sobre algumas fotografias, gesto que faz com que Napo recupere/recrie fragmentos de sua memória. Como se registra neste verbete da Enciclopédia Itaú Cultural, faz mais de cem anos que se produz cinema de animação no Brasil; as primeiras obras são do final da década de 1910. As produções da Turma da Mônica lançadas na década de 1980 ajudaram a consolidar no nosso imaginário que “desenho é coisa de criança”, mas obras como Napo podem e devem ser apreciadas por um público amplo, de todas as idades.

Os exercícios que compõem esta sequência didática foram pensados, inicialmente, para estudantes da Educação de Jovens e Adultos (EJA). No percurso imaginado, partimos da escrita de um texto breve para uma produção oral, passamos pela exibição e discussão da obra audiovisual e, por fim, encerramos com a reelaboração do texto inicial em uma produção escrita. Com essa proposta, em um plano, buscamos chamar a atenção sobre alguns aspectos que diferenciam a organização de um texto oral e de um texto escrito. Em outro plano, interessa-nos promover uma reflexão sobre a composição de um filme de animação e sobre temas contemporâneos transversais abordados na obra, como o processo de envelhecimento, o respeito e a valorização do idoso e a vida familiar e social.  

Boa leitura e boa sessão!

II. PLANO-SEQUÊNCIA

a)     Luz Um repertório de imagens

Objetivos

Este exercício inicial tem como objetivo estimular uma reflexão em torno da importância da memória para a constituição dos sujeitos e das relações interpessoais, mediante a produção de um texto oral sobre um objeto de valor afetivo para o estudante. Com essa proposta, inicia-se a sequência didática com uma prática de linguagem com a qual os estudantes já estão familiarizados e antecipam-se aspectos significativos da produção audiovisual a ser exibida e discutida.

Habilidades da BNCC

(EF02HI03) Selecionar situações cotidianas que remetam à percepção de mudança, pertencimento e memória.

(EF69LP12) Desenvolver estratégias de planejamento, elaboração, revisão, edição, reescrita/redesign (esses três últimos quando não for situação ao vivo) e avaliação de textos orais, áudio e/ou vídeo, considerando sua adequação aos contextos em que foram produzidos, à forma composicional e estilo de gêneros, a clareza, progressão temática e variedade linguística empregada, os elementos relacionados à fala, tais como modulação de voz, entonação, ritmo, altura e intensidade, respiração etc., os elementos cinésicos, tais como postura corporal, movimentos e gestualidade significativa, expressão facial, contato de olho com plateia etc.

(EM13LGG402) Empregar, nas interações sociais, a variedade e o estilo de língua adequados à situação comunicativa, ao(s) interlocutor(es) e ao gênero do discurso, respeitando os usos das línguas por esse(s) interlocutor(es) e sem preconceito linguístico.

Mãos à obra

Com certa antecedência, peça aos estudantes que escolham um objeto pessoal (uma peça de roupa, um item de decoração, um livro, um brinquedo antigo, uma fotografia etc.) que tenha um valor afetivo para eles. Explique que a ideia é apresentar esse objeto à turma e compartilhar com os colegas as razões que o tornaram parte de sua história, as memórias que se associam a ele.

Para auxiliar os estudantes a produzirem essa breve apresentação oral (de dois ou três minutos, no máximo), você pode sugerir que, no preparo de suas falas, tentem responder a algumas perguntas, como: “O que esse objeto é ou representa para mim?”; “Quando esse objeto entrou em minha vida?”; “É uma recordação de uma pessoa ou de alguma época especial?”; “Que sentimentos associo a esse objeto?”. Você também pode orientá-los a fazer anotações sobre o que querem dizer, uma vez que a escrita pode funcionar como um procedimento que colabora para a organização mental.

Reforce com os educandos que, no momento das apresentações, é importante que tenham atenção à postura corporal e tentem estabelecer contato visual com todos os colegas (e não só com o professor, como muitas vezes ocorre), assim, a turma toda se sente incluída e convidada a acompanhar a história com cuidado.

Com esse exercício, partindo da organização de um discurso sobre as experiências dos próprios estudantes, abrimos caminho para a exibição do curta.

O desenho apresenta um senhor branco, com cabelo branco, óculos, camisa branca e calça cinza. Ele está sentado em uma poltrona. Em frente a ele, há o neto, um menino branco, com cabelo castanho e óculos.
Napo (2020) | imagem: divulgação

 

b)     Câmera Novos olhares sobre o cinema, novos olhares sobre o Brasil

Objetivos

Com a roda de conversa que deve suceder à exibição do curta-metragem, busca-se contribuir para o letramento audiovisual dos alunos, promovendo uma reflexão sobre alguns elementos do filme que participam da produção de sentidos e sobre alguns temas abordados na obra. Nesse exercício coletivo de interpretação de uma produção audiovisual, objetiva-se ressaltar aspectos significativos da forma e do conteúdo do filme.

Habilidades da BNCC

(EM13LGG602) Fruir e apreciar esteticamente diversas manifestações artísticas e culturais, das locais às mundiais, assim como delas participar, de modo a aguçar continuamente a sensibilidade, a imaginação e a criatividade.

(EF69AR03) Analisar situações nas quais as linguagens das artes visuais se integram às linguagens audiovisuais (cinema, animações, vídeos etc.), gráficas (capas de livros, ilustrações de textos diversos etc.), cenográficas, coreográficas, musicais etc.

(EM13LGG101) Compreender e analisar processos de produção e circulação de discursos, nas diferentes linguagens, para fazer escolhas fundamentadas em função de interesses pessoais e coletivos.

(EM13CHS502) Analisar situações da vida cotidiana, estilos de vida, valores, condutas etc., desnaturalizando e problematizando formas de desigualdade, preconceito, intolerância e discriminação, e identificar ações que promovam os Direitos Humanos, a solidariedade e o respeito às diferenças e às liberdades individuais.

Mãos à obra

Se possível, exiba o curta em um ambiente adequado para a projeção de filmes, como uma sala com pouca luz e algum isolamento acústico para evitar interferências externas. Também oriente os estudantes a desligarem ou deixarem os celulares no modo avião para que chamadas ou notificações não atrapalhem a experiência de suspensão do tempo e imersão em uma história nova proporcionada pelo cinema.

A depender de como estiver seu cronograma, você pode organizar a exibição e a discussão da obra de modos distintos. Uma possibilidade seria exibir o filme uma primeira vez e, na sequência, abrir uma roda de conversa para que os educandos possam expressar suas impressões e opiniões espontaneamente. Nesse momento, eles podem dizer do que gostaram, o que lhes chamou a atenção, algum ponto que não tenha ficado claro etc. Antes de uma segunda exibição, divida a turma em grupos e sugira que cada grupo se concentre na observação de um aspecto em particular. Veja a seguir algumas sugestões do que cada um deles pode focalizar.

- Que recursos são empregados para a comunicação entre os personagens e o desenvolvimento da narrativa? 
- Que elementos do curta nos permitem identificar o tempo e o espaço em que ocorre a história?
- O que acontece com o personagem que se encontra em uma situação de maior vulnerabilidade causada por um adoecimento?
- Qual personagem da trama é responsável por cuidar dos demais?

Caso você tenha menos tempo disponível para realizar esta sequência didática, pode exibir o curta uma vez só e, antes disso, já dividir a turma em grupos e propor em quais aspectos eles devem prestar mais atenção. Insistimos nessa divisão em grupos porque muitos estudantes se sentem mais à vontade para se expressar dessa maneira; além disso, o trabalho inicial com um número reduzido de colegas pode ser um facilitador para que todos consigam exercitar a fala e a escuta.

Por não apresentar diálogos em sua composição, o filme exige que o espectador esteja atento a detalhes da expressão facial e corporal dos personagens e também às modulações na trilha sonora. O exame da repetição de cenas parecidas com diferenças em alguns detalhes é importante para compreender a mudança na intenção e na relação entre os personagens. Comparemos, por exemplo, as duas cenas em que avô e neto são vistos dormindo:

Avô e neto estão dormindo lado a lado, cada um em sua cama.
Napo e João em momentos diferentes da narrativa (e da relação) | imagem: divulgação

Avô e neto estão dormindo lado a lado, cada um em sua cama.
Napo e João em momentos diferentes da narrativa (e da relação) | imagem: divulgação

A perspectiva nos dois recortes é a mesma: os dois dividem o quarto e são vistos de cima. João dorme no chão, enquanto seu avô dorme na cama que costumava ser sua. Na primeira cena, quando ainda não têm intimidade, João está deitado de costas para o avô e sua expressão facial revela tristeza ou angústia (em uma cena anterior, o menino estende a mão ao avô em um gesto de boas-vindas, mas ele não retribui). Na segunda imagem, em um momento em que já estão conectados, os corpos dos dois personagens voltam-se um para o outro com expressões que sugerem relaxamento, tranquilidade.

No curta, o principal passatempo de João é desenhar. Um dia, no espaço em branco do verso de um retrato, ele faz um desenho inspirado no momento registrado pela fotografia. Se as fotos, sozinhas, já não comunicavam nada a Napo, os desenhos passam a despertar o seu interesse. O menino não demora a perceber que sua brincadeira se mostrou capaz de tocar o avô e fazê-lo revisitar e reelaborar suas memórias. Esse gesto do menino, sempre afetuoso, de intervir no passado, acaba aproximando-o de seu avô, e este de sua filha. Sabemos que os desenhos de João produziram um efeito sobre Napo porque a técnica utilizada na animação se transforma: a animação em 3D, empregada para representar o cotidiano dos personagens, é substituída por trechos com animação em 2D:

O avô está sentado em uma poltrona azul. Ele é branco, com cabelo branco, óculos, camisa azul e calça cinza. No chão, está o neto desenhando.
Napo assiste à TV enquanto João desenha na sala (animação 3D) | imagem: divulgação

 

No desenho, há um menino segurando um sorvete. Ele tem cabelo castanho, blusa amarela e laranja e bermuda jeans. De costas, olhando para o garoto, há um senhor.
Lembrança de Napo vinculada ao momento registrado na fotografia e ativada pelo desenho de João (animação 2D) | imagem: divulgação

É importante que os estudantes observem essa alteração na técnica empregada, pois esse aspecto formal do filme é essencial para o desenvolvimento da narrativa. Em mais de uma entrevista, Gustavo Ribeiro, diretor e um dos roteiristas do curta, afirmou que o filme foi, em alguma medida, inspirado na relação que os realizadores da produção tiveram com seus avós quando eram crianças. A presença de apenas uma televisão na sala, que deveria ser compartilhada por toda a família, o atualmente obsoleto aparelho de videocassete ao lado da TV, o telefone fixo sobre um móvel na sala e a ausência de celular mediando a relação entre os personagens são elementos que nos permitem situar a história em um tempo passado em relação ao nosso – mais precisamente na década de 1990, quando os profissionais envolvidos na produção do filme eram crianças. Outros detalhes, como o pote de arroz no armário da cozinha ou a louça branca com detalhes em laranja, nos permitem identificar que essa história se passa no Brasil de alguns anos atrás:

O avô está sentando na poltrona, com a ajuda da mãe. Do chão da sala, no tapete verde, o menino olha para os dois adultos. A avô usa bengala. No espaço, há também uma janela e uma TV de tubo.
Para um adulto, muitos podem ser os elementos familiares nesta cena: o modelo do interruptor na parede ao lado da porta, o telefone fixo sobre o móvel de madeira, a televisão com tubo, o aparelho de videocassete etc. | imagem: divulgação


O desenho traz um garoto comendo. Ele está sentado à mesa. O menino é branco, usa óculos e tem cabelo castanho. Atrás dele, há um armário e uma parede azul.
Nesta cena em uma cozinha tipicamente brasileira, é possível ler “arroz” em um pote do armário e ver o alimento no prato do menino | imagem: divulgação
 

 

Considerando o público para o qual essa sequência didática foi pensada, os estudantes da Educação de Jovens e Adultos (EJA), é possível que o curta-metragem produza diferentes tipos de identificação; seja porque o estudante é uma pessoa idosa, seja porque é uma pessoa adulta que precisa cuidar de um familiar idoso. Em ambos os casos, falar sobre envelhecimento, sobre os efeitos da passagem do tempo sobre nossos corpos e sobre como essas transformações afetam as vidas e as relações pode ser um tema tão delicado quanto importante. Segundo dados do “Censo 2022”, a parcela da população brasileira com 60 anos ou mais cresceu 56% em relação a 2010. Fortemente vinculada a essa mudança na pirâmide etária na população, deu-se a inserção no debate público de temas como etarismo (ou idadismo), denominação das práticas discriminatórias baseadas na idade. A discussão em torno do curta pode ser uma boa oportunidade para relembrar que o Estatuto da Pessoa Idosa, Lei no 10.741, de outubro 2003, garante uma série de direitos a esse grupo tão vulnerável. No artigo 3º, diz-se que é “obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do poder público assegurar à pessoa idosa, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária”. Nesse sentido, o filme pode ser interpretado como um exemplo de uma história na qual uma pessoa idosa teve seus direitos respeitados.

Por fim, outro tema sobre o qual vale a pena conversar com a turma (que, muito provavelmente, é composta de algumas alunas adultas) é o trabalho de cuidado exercido pelas mulheres no Brasil (questão que foi tema da redação do Exame Nacional do Ensino Médio, o Enem, na edição de 2023). Pelo que vemos no curta-metragem, cabe a Lenita (ao que tudo indica, uma mãe solo) se desdobrar para cuidar de seu pai, com Alzheimer, e seu filho, que ainda é criança. Na história, o neto, ao tentar se aproximar do avô, colabora para reduzir a carga de trabalho mental da mãe, no entanto, fora da ficção, a vida das mulheres pode ser muito mais dramática. Segundo dados do “Censo 2022”, as mulheres dedicam, aproximadamente, 10 horas a mais ao cuidado de pessoas e/ou aos afazeres domésticos do que os homens. Na Região Sudeste, segundo a pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os homens dedicam 12,1 horas por semana, enquanto as mulheres, 21,3 horas semanais. Há que se considerar ainda o recorte de raça/etnia. Mulheres pretas ou pardas dedicam mais horas que mulheres brancas. É fundamental que os educandos reflitam sobre os impactos das relações de gênero na vida de cada um. Em razão da divisão desigual do trabalho de cuidado, as mulheres acabam tendo menos tempo para dedicar a atividades que as beneficiariam, como, por exemplo, estudar.

c)     Ação Compartilhando saberes, trilhando mais caminhos

Objetivos

 

Com este último exercício, busca-se retomar e reelaborar a apresentação oral do exercício inicial, adaptando-a à modalidade da escrita formal em língua portuguesa do Brasil. Espera-se que o curta-metragem e a discussão inspirem a produção textual dos alunos e que eles percebam, com o auxílio de uma ferramenta de inteligência artificial, algumas diferenças entre oralidade e escrita.

Habilidades da BNCC

(EM13LP15) Planejar, produzir, revisar, editar, reescrever e avaliar textos escritos e multissemióticos, considerando sua adequação às condições de produção do texto, no que diz respeito ao lugar social a ser assumido e à imagem que se pretende passar a respeito de si mesmo, ao leitor pretendido, ao veículo e mídia em que o texto ou produção cultural vai circular, ao contexto imediato e sócio-histórico mais geral, ao gênero textual em questão e suas regularidades, à variedade linguística apropriada a esse contexto e ao uso do conhecimento dos aspectos notacionais (ortografia padrão, pontuação adequada, mecanismos de concordância nominal e verbal, regência verbal etc.), sempre que o contexto o exigir.

(EF69LP08) Revisar/editar o texto produzido – notícia, reportagem, resenha, artigo de opinião, dentre outros –, tendo em vista sua adequação ao contexto de produção, a mídia em questão, características do gênero, aspectos relativos à textualidade, a relação entre as diferentes semioses, a formatação e uso adequado das ferramentas de edição (de texto, foto, áudio e vídeo, dependendo do caso) e adequação à norma culta.

(EM13LGG701) Explorar tecnologias digitais da informação e comunicação (TDIC), compreendendo seus princípios e funcionalidades, e utilizá-las de modo ético, criativo, responsável e adequado a práticas de linguagem em diferentes contextos.

Habilidades da BNCC Computação

(EM13CO09) Identificar tecnologias digitais, sua presença e formas de uso, nas diferentes atividades no mundo do trabalho.

(EM13CO10) Conhecer os fundamentos da Inteligência Artificial, comparando-a com a inteligência humana, analisando suas potencialidades, riscos e limites.

Mãos à obra

Após a exibição e a discussão sobre Napo, peça aos estudantes que escrevam no caderno um texto no qual eles narrem e/ou descrevam a lembrança associada ao objeto sobre o qual fizeram a apresentação oral. A escrita, neste momento, não é opcional, mas a atividade em si. Dada a praticidade proporcionada pelos aparelhos celulares, que permitem fazer registros fotográficos, gravar áudios e escrever textos com o apoio do corretor automático, é possível que a escrita à mão não seja uma prática tão frequente no cotidiano dos estudantes. Entretanto, um estudo recente mostra que escrever à mão ajuda no aprendizado. O esforço exigido para a realização dessa tarefa complexa aumenta a atividade cerebral em regiões responsáveis justamente pelo desempenho da memória e pelo processamento de informações motoras e visuais.

Faz-se necessário que essa atividade seja realizada em sala de aula, com seu apoio e supervisão. Para alguns estudantes da EJA, a escrita pode ser um desafio e a colaboração dos colegas e do professor pode fazer a diferença para superá-lo.

Quando a primeira versão do texto estiver pronta, sugira que os estudantes a digitem em uma ferramenta de inteligência artificial para que se verifique se permanecem nessa produção escrita marcas de oralidade. Para o melhor uso da ferramenta, construa, junto com a turma, um comando (prompt) adequado, isto é, um comando dado pelo usuário que deve orientar a formulação da resposta pela ferramenta. Inicialmente, os educandos podem solicitar que a ferramenta identifique no texto formas linguísticas presentes em um texto oral, mas que devem ser evitadas em um texto escrito. É possível que na escrita dos alunos ainda permaneçam marcadores conversacionais, como “bom” no início do texto ou “né” em finais de sentença. É importante que os estudantes entendam que essas formas, tão produtivas em textos orais, não devem aparecer em produções escritas mais formais.

Um segundo comando dado à ferramenta pode ser o de identificar desvios gramaticais e inconsistências em relação a convenções da escrita (como erros ortográficos). É importante que no prompt se peça que a ferramenta identifique as formas linguísticas e explique por que seu uso é inadequado em um texto escrito mais formal – esta sequência didática pode ser inserida em momentos diferentes da educação linguística dos estudantes, uma vez que ela pode funcionar tanto para a introdução de um conteúdo novo como para a revisão de algo que já foi trabalhado. Para encerrar a atividade, peça aos estudantes que escrevam a versão com ajustes na mesma folha e entreguem a você. A justaposição das duas versões pode favorecer a identificação de dificuldades da turma e a verificação se o uso da ferramenta foi produtivo. Não é demais recordar que essas tecnologias devem ser utilizadas com cuidado, como apoio para a escrita, mas nunca para substituir o trabalho do pensamento. Do contrário, em vez de ajudar, elas podem prejudicar quem as utiliza.

Por fim, você pode guardar a produção dos alunos e devolver-lhes no final do ano letivo. Desse modo, o próprio texto transforma-se em um item de um relicário capaz de salvar uma memória vinculada a um objeto do passado (possivelmente mais distante), mas também de registrar um momento do passado recente, parte do processo de aprendizagem em que os estudantes se encontram.

III. CORTA! QUE TAL UM POUQUINHO DOS BASTIDORES?

- O menino e o mundo (2013) é um longa-metragem de animação escrito e dirigido por Alê Abreu. O filme, que foi uma das inspirações para a produção de Napo, recebeu prêmios em festivais nacionais e internacionais e foi indicado ao Oscar de Melhor Animação em 2016. Na narrativa, um garoto que morava no campo com a família sai pelo mundo em busca do pai, que abandonara o lar. A animação pode ser vista na plataforma de streaming gratuita Itaú Cultural Play.

- O Anima Mundi foi o maior festival de animação cinematográfica da América Latina. Com edições anuais entre 1993 e 2019, realizava sessões nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro. No ano de sua última edição, perdeu o apoio financeiro de seu principal patrocinador e só aconteceu graças a um financiamento coletivo. Depois, veio a pandemia e as medidas de isolamento adotadas para evitar o contágio pelo coronavírus impuseram restrições que ocasionaram na interrupção do festival. Em entrevista à revista Bravo!, em setembro de 2023, César Coelho, um dos fundadores do evento, falou sobre os planos de retomar o festival, o que ainda não aconteceu. 

- Ainda no mundo das animações, no canal do Itaú Cultural no YouTube, foi publicada uma entrevista com Rosana Urbes, ilustradora e animadora brasileira que tem em seu currículo uma passagem pelos estúdios Disney, onde trabalhou em obras como Mulan (1998) e Lilo e Stich (2002). Rosana dirigiu e é uma das autoras do roteiro de Guida (2014), curta de animação que também está disponível na plataforma IC Play, e a partir do qual também se elaborou a sequência didática #6 do projeto CineAula IC Play.

Na cozinha, a mãe está lavando louça. Ela é branca, usa uma blusa amarela e tem cabelo castanho. Atrás, na mesa, há o neto e o avô.
Napo (2020) | imagem: divulgação

IV. SOBEM OS CRÉDITOS

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, DF: Ministério da Educação, 2018. Disponível em: gov.br/mec/pt-br/escola-em-tempo-integral/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal.pdf. Acesso em: 19 out. 2025.

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular: Computação – Complemento à BNCC. Brasília, DF: Ministério da Educação, 2022. Disponível em: portal.mec.gov.br/docman/fevereiro-2022-pdf/236791-anexo-ao-parecer-cneceb-n-2-2022-bncc-computacao/file. Acesso em: 19 out. 2025.

BRASIL. Lei No 10.741, de 1º de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto da Pessoa Idosa e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República, 1º out. 2003. Disponível em: planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2003/L10.741.htm. Acesso em: 19 out. de 2025.

BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Temas contemporâneos transversais na BNCC: contexto histórico e pressupostos pedagógicos. Brasília: MEC, 2019. Disponível em: basenacionalcomum.mec.gov.br/images/implementacao/contextualizacao_temas_contemporaneos.pdf. Acesso em: 19 out. de 2025.

CINEMA de animação. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025. Disponível em: enciclopedia.itaucultural.org.br/termos/80285-cinema-de-animacao. Verbete da Enciclopédia.  
ISBN: 978-85-7979-060-7. Acesso em: 19 out. 2025.

CHINAGLIA, Juliana Vegas. A língua portuguesa e a participação na sociedade. Brasília, DF: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão, 2025.

CHINAGLIA, Juliana Vegas. Do analógico ao digital: as culturas do século XXI. Brasília, DF: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão, 2025.

CORREA, Maria Paula de Jesus. CineAula IC Play #6: a velhice como um tempo de dançar realizações. São Paulo: Itaú Cultural, 8 set. 2025. Disponível em: itaucultural.org.br/secoes/cineaula-ic-play/cineaula-ic-play-6-a-velhice-como-um-tempo-de-dancar-realizacoes. Acesso em: 19 out. 2025.

DIMARCH, Bruno Fischer. Arte e identidade. Brasília, DF: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão, 2025.

ENTREVISTA: Gustavo Ribeiro, diretor do curta-metragem brasileiro Napo. Animation Info. Disponível em: infoanimation.com.br/p/entrevista-gustavo-ribeiro-diretor-do.html. Acesso em: 19 out. 2025.

FREUND, Alexander. Escrever à mão ajuda no aprendizado, aponta estudo. Deutsche Welle, 7 abr. 2025. Disponível em: dw.com/pt-br/escrever-%C3%A0-m%C3%A3o-ajuda-no-aprendizado-aponta-estudo/a-72118940. Acesso em: 19 out. 2025.

GOMES, Irene; BRITO, Vinícius. Censo 2022: número de pessoas com 65 anos ou mais de idade cresceu 57,4% em 12 anos. Agência IBGE Notícias, 27 out. 2023. Disponível em: agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/38186-censo-2022-numero-de-pessoas-com-65-anos-ou-mais-de-idade-cresceu-57-4-em-12-anos. Acesso em: 19 out. de 2025.

IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Estatísticas de gênero: indicadores sociais das mulheres no Brasil. 3. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2024. Disponível em: biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv102066_informativo.pdf. Acesso em: 19 out. 2025.

MARUCHEL, Humberto. Um recomeço para o Anima Mundi. Bravo!, 13 set. 2023. Disponível em: bravo.abril.com.br/cinema-tv/anima-mundi-festival-animacao-retorno-2024. Acesso em: 19 out. 2025.                            

NAPO. Direção: Gustavo Ribeiro. Brasil, 2020.

ITAÚ CULTURAL. Rosana Urbes – Encontros de Cinema (2017) – Libras. YouTube, 28 dez. 2017. Disponível em: youtube.com/watch?v=YbBQlIZMY1o. Acesso em: 19 out. 2025.

MINIBIOGRAFIA DO ELABORADOR

Silas Silva (ele/dele) é bacharel e mestre em letras pela Universidade de São Paulo (USP) e professor de língua portuguesa e língua espanhola no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), onde desenvolve projetos de formação de leitores de textos literários.

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