LIVRO

O Itaú Cultural apoiou a publicação de Una Shubu Hiwea – Livro Escola Viva do Povo Huni Kuin do Rio Jordão, organizado pelo pajé Dua Buse, da aldeia Coração da Floresta, uma das 36 construídas ao longo daquele rio, para distribuição entre seus habitantes. Aqui, ele apresenta a obra que poderá ser vista na mostra, acompanhada de publicação realizada pelo Itaú Cultural.

 

 

Muito haux, muito haux, muito haux. Haux Haux!

 

Então vou começar a aplicar sobre o nosso trabalho de hoje em diante e também cada vez mais nós estamos renovando para nós amostrar o nosso povo, como nosso filho, nossos netos, nossos sobrinhos, nossos parentes.

 

Eu estou por aqui, eu sou pesquisador de medicina e entendimento das ciências da natureza. Eu vou apresentar meu nome, minha idade, minha aldeia, meu povo, tudo. Pelo conhecimento de nome indígena eu sou Dua Buse. Nome em português eu sou Manuel Vandique Kaxinawa. Eu já tenho, não sei se meu pai errou, eu tenho meu documento já com 82 anos.

 

Sempre eu vinha pesquisando nosso sistema de saúde. Antes, quando meu pai estava vivo, eu acompanhava meu pai quando ia tirar uma espécie de medicina. Aí eu ia perguntando e ele me explicava direitinho, ensinava bem. Assim que eu vinha aprendendo devagar com ele. E também conhecer as doenças tradicionais que existiam e ainda existem. Porque esse nosso trabalho, que nós estamos fazendo, não é assim brincando, não é qualquer coisa não. É coisa verdade que nós estamos fazendo sobre a saúde indígena.

 

Esse sistema da saúde indígena é nossa cultura, nossa medicina, nossa medicina tradicional. Existem muitas medicinas. Pesquisamos 200, 300 e poucos espécies de medicina. E cada vez nós estamos aumentando o nosso povo. Nossos filhos, nossos netos… estão aumentando cada vez mais. Aí eu achei importante para eles, pesquisei e pensei para nós fazermos um parque de medicina perto da nossa aldeia onde nós vamos plantar a nossa medicina para ensinar os nossos netos, filhos, sobrinhos, genros e tudo.

 

É por isso que nós já temos nossos parques de cada aldeia. Na minha eu tenho o meu parque de medicina e lá do meu primo, o Sávio, também já tem bastante plantado. O parque dele já está organizando. Aí cada vez mais vamos continuar mais plantando aquelas espécies que a gente não tem aqui, aonde nós achar de longe e trazer aquela espécie para gente plantar no nosso parque. Assim vai ficar mais melhor, para quando nós precisar daquela espécie nós tirar do nosso parque que fica mais perto e mais fácil.

 

E também não é só eu que estou sabendo. Eu estou querendo ensinar para aqueles jovens, tanto como feminina e masculina. Eles têm que ver, tem que aprender, tem que praticar, junto comigo. Alguém precisar de mim, já eu vinha convidando os meus amigos para a gente plantar medicina e aprender também.

 

Então estamos aqui, esses dois velhos, nós somos pesquisadores de medicina, nós já temos praticado, nós já aprendemos bastante. Aprendemos o nome da medicina e como tratar as doenças como dor na coluna, conjuntivite, assim, quando a pessoa tiver com epilepsia, quando alguém tiver com qualquer problema a gente já vai consultar para poder tirar a nossa medicina.

 

Assim o Livro Prevenção Dieta Indígena porque nosso povo de antigamente, não de hoje em dia, antes do contato com parente branco, quando vivia só índio, eles não conheciam esses parentes brancos, eles viviam nus, eles comiam carne de caça de animais. Aquelas carnes de caça às vezes fazem um problema num jovem, numa criança, aí essa criança depois que nasce, depois que cresce, o pai e a mãe tem que fazer uma prevenção para ele, uma dieta.

 

Nós chama dieta. Para não comer o fígado devido os dentes. Fazendo essa prevenção meu povo vivia uma porção de anos 700/800 anos, até 1000 anos dizia que vivia. Nesse tempo vivia meus parentes maiores que nós, alto, mais grosso, mais forte. Aí se teimoso come aquelas coisas que faz mal para os jovens, quando os jovens pega, sente aquelas doenças o pajé já consulta para fazer remédio.

 

O jovem comendo os ovos dos animais, às vezes um dia nasce um tumor em qualquer canto. Como ovos de jabuti, ovos tracajá, mutum, nambu, jacu, jacami e tudo, até ovos de peixe não pode comer também senão fica com cara cheia de caroço. Outra coisa, a criança jovem até 18/20 anos, eles faziam uma dieta, uma prevenção para não comer filhotes de animais, como filhote de anta, viado, porquinho, tudo. Para evitar a epilepsia. Quem não comeu aqueles filhotes de animais nunca tem essa epilepsia. Se cai na besteira de comer aqueles filhotes de animais, embora que não for ele, mas mais adiante o filho, o neto vai dar uma epilepsia. Ai por isso que eles faziam prevenção. Mãe e pai pastoravam para não comer. Essa nossa dieta como prevenção eu pesquisei, escrevi um bocado aqui.

 

Começa por fazer prevenção e dieta com a nossa mãe. Nossa mãe, mulher, com 12 anos, 13 anos começa a fazer um sangramento e aí a gente começa a fazer dieta. Com os 13 anos saiu a primeira doença dela… aí a mãe começa, passa genipapo e deita três dias, deitando três dias evitar comer sal, não comer coisas doces, não comer carne e não beber água. São quatro objetos que faz mal.

 

A moça passa cinco ou mais dias aí o pai levanta chama o pajé, tira aquela espécie para passar na cabeça e pega água do olho d`agua e o pajé pega o tição de brasa, pega um copo d`agua e bota essa brasa e a brasa paga, né? Aí dá para beber. Assim que levantar não é para pegar a água e beber não. Tem que fazer mais forte. E também a carne só vai comer depois que levantar. Ai o Pajé vai pro mato tira 4 ou 5 espécies para poder lavar a cabeça com água fria para ela poder tomar um banho.

 

Bom aí vem vindo até que saiu fábrica. O pai fabricou criança bebê, a criança tá dentro da grávida. A mãe vai fazer dieta. Não vai mais comer carne de macaco guariba, vai fazer uma prevenção para não comer jabuti enquanto está grávida, vai fazer uma prevenção para não comer bode, peixe bode, tem uma porção de coisas. A mãe levanta e já vai andar. Depois que a criança nascer, aí os dois (pai e mãe) já vão fazer dietas para a criança crescer normal para não ter doença e depois quando a criança vem crescendo, quando ela já está comendo alimento, aí o pai e a mãe já vão escolher aquelas coisas boas para comer: peixe, querendo comer carne já escolhe os animais que já tem idade, o que já dá para comer, mas não filhote.

 

Fazem alimentação para evitar dente, mãe e pai não dão figado para ele comer, ovos também, ovos de peixe se a criança comer vai sair muita espinha na cara e até no corpo todo e por isso a gente faz prevenção para não comer ovos de peixe. Outra coisa, jabuti, jacaré, piranha aquilo dá doença de dor na coluna. A gente vai fazer prevenção para não comer jabuti, filhote desse tamanho, se for maior dá para comer. Só faz prevenção daquele filhote para evitar epilepsia como eu já disse.

 

Outra coisa, o jovem comendo cangati cozido quando já fica meio idoso que nem eu velho, já fica com vista ruim, então por isso tem que evitar para ficar velho com vista bom. Meu povo vivia assim. Hoje em dia esses jovens não estão sabendo o que é, por isso que nós estamos querendo fazer um livro para eles verem. Se aquele que conhece vão cumprir se alguém não tiver acreditando deixa como está. É assim que nós estamos publicando nosso trabalho. O livro,

que tem esse nome na língua Una Isi Kutã.

 

Continuei pesquisa sobre a medicina vegetal para nós tomar com água fria, ficar forte, curar tontura, curar tosse e quando a mulher estiver grávida, na hora do parto para não sofrer muito para ganhar neném normal, tem a nossa medicina para tomar. E outra coisa: quando a gente está muito cansado a gente vai pegar a medicina para tomar tudo isso que e a nossa pesquisa, medicina vegetal.

 

Nosso colírio: medicina colírio que nós pingamos como sananga, Himi Kais, tem um monte de colírio para gente pingar no nosso olho. E tem outro colírio como tipo assim, serve para quando tiver com vista ruim. O meu cangati está com vista ruim, tem que tirar aquele remédio do cangati para passar. Nós têm isso também, nosso colírio, eu pesquiso também, mas ainda não está publicado, só eu que pesquisei aqui. Ainda não mostrei pro meu amigo, meu companheiro.

 

Nós estamos aqui, vamos ver o que está faltando, é tudo isso nossa pesquisa, nosso trabalho e nosso livro. Eu que estou pesquisando com pena para não acabar com a nossa cultura é o resto remanescente da nossa cultura que tô tendo. Isso que quero mostrar para todo meu povo, para meus parentes, para nós fazer continuidade com o nosso trabalho, toda nossa região do Jordão, essas 32 aldeias. Nessas 32 aldeias cada pajé já estão fazendo o desenho do parque e o tratamento que eles estão fazendo. Eu acho que é tudo isso a minha aplicação aqui. (*)

 

 

A equipe do instituto preparou uma publicação especialmente para ser apresentada e distribuida ao público durante a mostra Una Shubu Hiwea – Livro Escola Viva do Povo Huni Kuin do Rio Jordão. Ao lado deles, participaram da confecção desta obra o artista Ernesto Neto, a editora Anna Dantes, a Dantes Editora e representantes das aldeias. É, literalmente, um trabalho realizado a muitas mãos. Segue o texto de apresentação:

Xiña Bena, o Novo Tempo dos Huni Kuin, momento em que esse povo indígena, natural da região amazônica entre Peru e Acre, se posiciona para transmitir suas tradições ao mundo contemporâneo, dialogando com não indígenas e preservando sua identidade. São tarefas conforme o conselho do pajé Agostinho Manduca Mateus Ika Muru (1944-2011): “A cultura é nossa maior proteção”.

 

Esta publicação é um gesto nesse sentido. Material que acompanha a exposição Una Shubu Hiwea - Livro Escola Viva do Povo Huni Kuin do Rio Jordão, este volume é, como a mostra, um resultado da visão e do trabalho do pajé Dua Buse. Reúne, além de textos de apoio, 13 mitos Huni Kuin. São histórias de tempos imemoriais que descrevem a origem desse povo, o aprendizado de seus costumes e sua ética, levada através dos tempos.

 

O modo de viver desse povo transparece nestas páginas, produzidas em uma parceria entre o Itaú Cultural, o artista Ernesto Neto e a editora Anna Dantes, a Dantes Editora e representantes das aldeias. Assim como a exposição, toda a edição foi discutida de forma colaborativa. Esse cuidado pode ser visto na fonte escolhida para os títulos – criada a partir de escritos desse povo –, na preservação e na transcrição dos materiais orais, da prosódia dos Huni Kuin.

 

O contato do Itaú Cultural com os Huni Kuin abrange outros projetos. O Rumos Itaú Cultural 2013-2014 também apoiou Huni Kuin: Os Caminhos da Jiboia, primeiro jogo eletrônico feito por essa população. Ainda mais, em uma tentativa de se aproximar dos 254 povos indígenas brasileiros, o instituto realizou neste ano e em 2016 o Mekukradjá - Círculo de Saberes, um ciclo de debates sobre os habitantes originários do território.

 

O instituto entende que é preciso evidenciar essas vivências que antecederam o Brasil, formaram sua identidade e, ainda assim, foram invisibilizadas por séculos. É preciso ter um pouco de jiboia, símbolo da metamorfose para os Huni Kuin. É preciso trocar de pele. É Xiña Bena. É momento de ouvi-los..

 

(*) Este texto é de autoria do pajé Dua Buse, da aldeia Coração da Floresta, publicado na apresentação do livro Una Shubu Hiwea – Livro Escola Viva do povo Huni Kuin do Rio Jordão, organizado por ele (Dantes e Itaú Cultural, 2017).

 

 

 

 

 

SERVIÇO

Exposição: UNA SHUBU HIWEA
Livro Escola Viva do povo Huni Kuin do Rio Jordão

Concepção e realização: Itaú Cultural e Dantes Editora

Organização: Pajé Manuel Vandique Kaxinawá Dua Buse

Montagem da exposição: Edilene Sales Huni Kuin Yaka,
José Mateus Itsairu, Menegildo Paulino Kaxinawá Isaka,
Rita Sales Dani e Shane Huni Kuin

Direção Criativa: Anna Dantes e Ernesto Neto

Fotografia e vídeo: Camilla Coutinho Silva

Vídeo de Agostinho Ika Muru: Nara Luz

Imagens aéreas: Taua Klonowski

Paisagem sonora e áudios: Yan Saldanha

 

Abertura: 6 de dezembro (quarta-feira), às 20h

Visitação: 7 de dezembro de 2017 a 13 de fevereiro de 2018

Pisos: -1 e -2

Entrada gratuita

 

Programação Núcleo Educativo

Encontros em Roda e Vivências com os Huni Kun

No espaço expositivo.

Dias 7 e 8 (quinta-feira e sexta-feira), às 18h30

Dias 9 e 10 (sábado e domingo), às 14h e às 16h

Duração aproximada: 60 minutos

Sem distribuição de ingressos

Classificação indicativa: Livre

Entrada gratuita

Itaú Cultural

Avenida Paulista, 149, Estação Brigadeiro do Metrô

Fones: 11. 2168-1776/1777

Acesso para pessoas com deficiência

Ar condicionado

Estacionamento: Entrada pela Rua Leôncio de Carvalho, 108

Se o visitante carimbar o tíquete na recepção do Itaú Cultural:

3 horas: R$ 7; 4 horas: R$ 9; 5 a 12 horas: R$ 10.

Com manobrista e seguro, gratuito para bicicletas.

www.itaucultural.org.br

 

     

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