Curatorial

obra de efeitos imensuráveis para a arte moderna e contemporânea

"Eu vim”, bordou Arthur Bispo do Rosario em um de seus fardões, com palavras acompanhadas pelos registros da data, da hora e do lugar. No Rio de Janeiro, em 22 de dezembro de 1938, à meia-noite, Bispo teve uma visão em que sete anjos anunciavam sua missão. Deixou a casa onde trabalhava e residia, no bairro de Botafogo, e partiu em direção à Igreja da Candelária, no Centro. Por dois dias percorreu pontos da cidade até se apresentar aos frades do Mosteiro de São Bento como aquele que viera julgar os vivos e os mortos. O jovem homem negro, natural de Japaratuba (SE), revelava ser Jesus. A polícia foi acionada e Bispo levado para o Hospício Nacional de Alienados. Diagnosticado com esquizofrenia, foi transferido para a Colônia Juliano Moreira, destino dos pacientes crônicos e indigentes.  

Ali, Bispo produziu boa parte de sua obra, fruto de um trabalho incansável. A mostra Bispo do Rosário - Eu vim: aparição, impregnação e impacto  traz para o Itaú Cultural (IC) 404 peças desse trabalho único, hoje preservado pelo Museu Bispo do Rosario Arte Contemporânea (mBrac), parceiro nesta exposição. Desde a sua primeira apresentação, em 1989, na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio de Janeiro, a obra de Bispo produziu efeitos imensuráveis para a arte moderna e contemporânea. Ao romper com o espaço-tempo, Bispo fraturou a história, desfazendo os traços que a conformam para, com essas mesmas linhas, bordar (para) o fim do mundo.
‍
Esta mostra se desdobra em dois núcleos. O primeiro trata do impacto e da impregnação da obra de Arthur Bispo do Rosário, que, ao instaurar um novo campo de possibilidades estéticas e éticas, reverbera na produção de artistas tão importantes como os representados nesta exposição. O segundo núcleo apresenta experiências artísticas realizadas em ateliês de artes de instituições psiquiátricas brasileiras, cujos efeitos refazem os rumos da arte brasileira.
‍
Ricardo Resende e Diana Kolker