Este boletim apresenta uma análise da evolução das empresas criativas entre os anos de 2010 e 2019 baseada no Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural. Não foi possível efetuar a análise do ano de 2020 em razão de as fontes de dados utilizadas[1] apresentarem uma defasagem temporal em sua publicação. Assim, os dados específicos mais recentes do total de empresas são de 2019, enquanto os dados disponíveis de receita bruta e lucro bruto mais recentes são de 2018.

O universo aqui analisado é composto de um conjunto de empresas cuja composição de trabalhadores é majoritariamente formada por criativos. Essas empresas desenvolvem atividades econômicas identificadas por 18 códigos Cnae[2] e foram agrupadas em dez setores: arquitetura; artes cênicas e artes visuais; atividades artesanais; cinema, música, fotografia, rádio e TV; design; editorial; moda; museu e patrimônio; publicidade e serviços empresariais; e tecnologia da informação.

As empresas criativas e o contexto econômico mais amplo

A participação das empresas criativas no total de empresas do Brasil no período de 2010 a 2019 se manteve em torno de 4%. A diferença de participação vem caindo desde 2015 e chegou ao seu menor patamar em 2019.

Conforme apontado pelo relatório Dez anos de economia da cultura no Brasil e os impactos da covid-19, publicado pelo Observatório Itaú Cultural com base no Painel de Dados, as empresas criativas têm acompanhado o crescimento do total de empresas de maneira mais alinhada, porém, o ritmo de queda de empresas do setor criativo é mais acentuado que o do total de empresas. Nesse sentido, ao analisarmos a série histórica, 2019 apresenta um valor inferior de empresas criativas em relação a 2010, enquanto o total de empresas do Brasil em 2019 está próximo ao total de 2013. Considerando essa tendência prévia e o impacto da pandemia de covid-19 no setor criativo e cultural, é possível que a queda no ano de 2020 seja ainda mais acentuada.Fonte: Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural.

Evolução do total de empresas e empresas criativas

 

Fonte: Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural.

Como podemos perceber, essa tendência de maior queda em relação ao total de empresas tem colocado as empresas criativas em uma situação de permanente declínio, mesmo quando há sinais de recuperação econômica, como em 2013. Podemos constatar isso a partir da taxa de natalidade e de mortalidade das empresas. Enquanto o total delas teve uma taxa positiva, mesmo que de maneira desacelerada até 2016, as empresas criativas já apresentavam queda a partir de 2014.

Taxa de natalidade e de mortalidade do total de empresas e das empresas criativas


Fonte: Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural.

Um aspecto interessante é que, ao analisarmos o lucro bruto e a receita bruta das empresas criativas no período, percebemos que há manutenção de uma tendência de aumento, apesar da diminuição do total de empresas. Esse movimento parece acompanhar o restante da economia, que tende a manter taxas de lucro bruto e receita bruta relativamente constantes independentemente do número total de empresas. As principais inflexões, nesse sentido, ocorrem a partir de 2016, tanto para o total de empresas quanto para as empresas criativas.

Lucro bruto e receita bruta – empresas criativas

 
Fonte: Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural. Valores corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

Uma possível explicação para essa pouca variação nas taxas de receita e de lucro, apesar da queda constante no número de empresas criativas a partir de 2014, é que o setor tem uma composição predominante de micro e pequenas empresas. Nesse sentido, a variação no total de empresas criativas é inerente à oscilação da quantidade de empresas menores, que têm receitas menores também, o que acaba não afetando de maneira significativa a receita e o lucro brutos. De maneira mais específica, o setor possui uma composição média de cerca de 97% de micro e pequenas empresas. Considerando os anos de 2010 e 2019 para comparação, percebemos que a composição por porte quase não se alterou, sendo as variações inferiores a 1%.

Porte das empresas criativas (2010-2019)

Fonte: Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural.

Ao mesmo tempo, a variação de natalidade e de mortalidade por porte demonstra que as micro e pequenas empresas são aquelas que vivem maior queda, tendo as empresas de porte grande, que são as menos representativas no total, apresentado até mesmo uma taxa positiva de 2017 para 2018. Ao analisarmos a variação acumulada entre 2010 e 2019, temos uma variação de -1% no total de empresas de porte micro, -7% nas pequenas, -7% nas médias e um crescimento de 10% nas grandes.

Taxa de natalidade e de mortalidade das empresas criativas por porte


Fonte: Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural.

Distribuição setorial e regional

Ao analisarmos o recorte por setor, especificamente aqueles mais ligados à cultura (atividades artesanais; artes cênicas e artes visuais; cinema, música, fotografia, rádio e TV; e museus e patrimônio), tendo como base os anos de 2010 e 2019, percebemos que todos tiveram algum tipo de crescimento no número de empresas. O único que apresentou diminuição foi o de atividades artesanais – -1.368 empresas, queda de cerca de 10% –, que tem um viés claramente mais tradicional em termos de modelo de negócio.

Total de empresas criativas por setor – cultura

Fonte: Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural.

Enquanto isso, ao analisarmos os setores de caráter mais criativo, percebemos que há uma evidente diminuição no número de empresas dos setores de moda (-11.429 empresas) e editorial (-2.903 empresas), de 17% e 32%, respectivamente. Nesse sentido, o setor editorial tem apresentado uma crise na última década ligada principalmente à questão da digitalização, o que poderia explicar essa diminuição na quantidade de empresas. Quando analisamos essa perda em termos de subclasse da Cnae 2.0 (ou seja, das atividades econômicas específicas sendo desenvolvidas pelas empresas), percebemos que a hipótese parece se confirmar, uma vez que a maior perda está naquelas atividades ligadas aos serviços impressos. Assim, a subclasse denominada 58298 – edição integrada à impressão de cadastros, listas e outros produtos gráficos – teve uma queda de 1.737, cerca de 50% para essa atividade específica e quase 60% do total para o setor editorial. Ao mesmo tempo, contudo, setores mais ligados à tecnologia, como de tecnologia da informação e publicidade, apresentaram crescimento considerável no número de empresas, com um aumento de 4.506 (+15%) e 7.079 (+67%), respectivamente.

Total de empresas criativas por setor – criativos

Fonte: Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural.

Com o mesmo recorte efetuado acima, dos setores mais culturais e dos mais criativos, ao analisarmos a receita bruta, com série temporal de 2010 a 2018, percebemos que os primeiros representam apenas cerca de 1/5 (20%) dos criativos, tanto em 2010 quanto em 2018 (dados mais recentes disponíveis) – tendo perdido em termos absolutos entre os anos de análise. Isso tem relação com a quantidade de empresas dos setores mais criativos, mas também com sua produtividade e capacidade de expansão.

Receita bruta das empresas – proporção criativas e culturais

 

Fonte: Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural. Valores corrigidos pelo IPCA.    

Ao analisarmos a composição específica, percebemos que, apesar de o setor de artesanato ter diminuído o número total de empresas, conforme visto anteriormente, foi o único que teve aumento na sua receita total bruta, enquanto os demais setores apresentaram apenas perdas.

Receita bruta das empresas criativas por setor – cultural

 

Fonte: Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural. Valores corrigidos pelo IPCA.

Quando olhamos para os criativos, percebemos que a diminuição do setor editorial foi grande, de cerca de 50%, o que demonstra o impacto que o setor vem sofrendo. O segundo setor com a maior queda foi o da moda (cerca de 10%). Os dois setores mais pujantes – tecnologia da informação e publicidade – tiveram um aumento bastante considerável de receita, de 57% e 29%, respectivamente. Nesse contexto, em termos absolutos, tecnologia de informação foi o setor que parece ter tido o maior crescimento, o que pode ter mantido a receita bruta dentro da média para a economia criativa como um todo.

Receita bruta das empresas criativas por setor criativos

Fonte: Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural. Valores corrigidos pelo IPCA.

Em relação à distribuição regional das empresas criativas, percebemos que também se mantém mais ou menos estável ao longo dos anos. Com 2010 e 2019 como referência, vemos que a distribuição tem variações muito pequenas, inferiores a 1%. Assim, proporcionalmente, a região Sudeste é a que apresenta o maior número de empresas criativas (cerca de 50%) e a região Norte o menor (entre 2,2% e 2,5%).

 Distribuição das empresas criativas por região brasileira (2010 e 2019)

Fonte: Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural.

Como já havia sido identificado, o ano em que houve mais empresas criativas no Brasil foi 2014. Em 2018, as regiões Norte, Nordeste e Sul ainda apresentavam um total de empresas criativas superior ao de 2010. De 2018 para 2019, todas as regiões tiveram perdas, mas somente Sudeste e Nordeste estão em patamares inferiores aos de 2010.

Distribuição das empresas criativas por região brasileira (2010-2019)


Fonte: Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural.

Ao compararmos o lucro bruto e a receita bruta, percebemos uma manutenção da distribuição proporcional à quantidade de empresas em cada região. A variação dessa distribuição ao longo dos anos é também bastante estável, com variações sempre inferiores a 1%.

Fonte: Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural.


[1] A Relação Anual de Informações Sociais (Rais), a Pesquisa Anual de Serviços (PAS) e a Pesquisa Industrial Anual – Empresa (PIA-Empresa)

[2] Conforme descrito no Painel de Dados.