A família

Meio terra, meio mar. Inezita sempre dizia que era assim. A família da mãe era dona de fazendas no interior de São Paulo. A do pai, vinda do Pará, se estabeleceu por muitos anos na litorânea cidade de Santos. Nessa dicotomia, aliás, nem todo mundo sabe que a apaixonada pela cultura caipira preferia a praia.

Na família, a dicotomia ia além da localização geográfica. O lado materno era mais tradicional e rígido se comparado ao lado paterno, mais liberal e menos austero. De tudo e de todos Inezita Barroso sempre falou muito. Da fazenda dos tios, passando pelas brincadeiras com os primos, chegando à importância do cunhado ator, que a apresentou a vários amigos artistas.

Juventude

Formada na Universidade de São Paulo (USP), Inezita estudou biblioteconomia, curso recém-aberto em um espaço anexado ao prédio da instituição na Rua Maria Antônia, no centro da capital paulista | foto: acervo pessoal

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Ainda jovem, Inezita aprende a tocar violão antes de viola | foto: acervo pessoal

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Noiva

Inezita casou-se com Adolfo Cabral Barroso em setembro de 1947 | foto: acervo pessoal

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Inezita Barroso, a vida [capítulo: A família]

Por Paulo Freire*

*Curador da Ocupação Inezita Barroso, Paulo Freire conta aqui a história de uma vida. Uma vida de 90 anos, muitas músicas e muitos “causos”. Dividida em seis capítulos (A menina, A família, A artista, A pesquisadora, Eta programa que eu gosto e Um legado), essa história se espalha pelas seções do site. Um passeio pela vida e pela obra daquela que é uma das artistas mais importantes da cultura popular brasileira.

Aos 18 anos, Inezita conheceu Adolfo Barroso, com quem se casou quatro anos depois. A família do marido era amante das artes. Foi a partir daquele encontro que, de fato, nasceu Inezita Barroso! Em 1949, ela deu à luz Marta, a única filha do casal.

Adolfo cursou direito no Largo de São Francisco. O Centro Acadêmico XI de Agosto promovia encontros e reuniões, nos quais Inezita já se destacava tocando violão e cantando. O irmão de Adolfo, Maurício Barroso, era ator ligado ao Teatro Brasileiro de Comédia (TBC). Desde os tempos de namoro com Adolfo, Inezita frequentava o XI de Agosto e assistia a todas as montagens do TBC. Convivia com artistas como Paulo Autran e Tônia Carrero, além de boêmios como o biólogo e compositor Paulo Vanzolini.

Nas reuniões dos profissionais de teatro, sempre buscavam o violão e o davam para Inezita. A moça, com sua voz de contralto, firme, trazia um repertório que provocava a todos, pois, além de canções difundidas pelo rádio, ela cantava músicas da roça, como “Boi Amarelinho”, “A Viola e o Baraio” e a poderosa “Moda da Pinga”! É só imaginar aquela jovem linda, de família tradicional paulista, cantando: “Eu bebi demais e fiquei mamada / Eu caí no chão e fiquei deitada / Aí eu fui pra casa de braço dado / Ai, de braço dado, ai, com dois sordado / Ai, muito obrigado”.

Separou-se de Adolfo em 1956, aos 31 anos.

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Mãe

Inezita Barroso radiante, em foto tirada no hospital onde teve Marta, sua única filha | foto: acervo pessoal

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Seção de vídeo

Memórias da filha Marta

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Álbum de bebê de Marta, filha de Inezita e Adolfo | foto: acervo pessoal

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Álbum de família | Acervo pessoal

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Três gerações

Anos 1950: Inezita posa com a mãe, Ignez, e a filha, Marta, na Praça da República, em São Paulo | foto: acervo pessoal

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foto: acervo pessoal

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Metade mar

Inezita Barroso, cuja família paterna era do litoral, nutria paixão declarada pela praia | fotos: acervo pessoal

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Sempre presente

Paula em casamento ao lado da avó, Inezita, 2000 | foto: acervo pessoal

Por Jullyanna Salles

A vida toda, Paula ouviu comentários sobre sua semelhança com a avó, Inezita Barroso. Quando mais nova, não gostava muito das comparações com uma mulher décadas mais velha; levava como ofensa, “coisa de adolescente”, brinca. Anos depois, acompanhada dos filhos ainda pequenos, assistiu a um filme estrelado pela cantora e lidou com a difícil tarefa de explicar aos garotos que a atriz na TV não era ela mesma. E foi assim que se deu conta de que carregava os traços familiares mais famosos.

Essa foi apenas uma das situações em que a semelhança com Inezita Barroso se manifestou na vida de Paula. “Turistando” em Paris (França), foi abordada por um estranho no ônibus: “Um cara me cutucou e falou ‘Vocês são brasileiros, né?’. Respondi que sim. ‘De São Paulo, né?’. Confirmei já achando bem esquisito. Daí ele terminou: ‘E você é a neta da Inezita Barroso, né?’ ”. Era uma pessoa que tinha trabalhado com a minha avó na TV Cultura”, conta rindo.

Tímida para os palcos, Paula também seguiu a carreira artística, mas distante do público. Artista plástica, destaca que a semelhança com a avó não se restringe ao físico: “Somos muito determinadas, sabe? Não interessa se alguém fala que não pode, se a gente encanar que é aquilo que quer fazer, não tem quem consiga fazer a gente mudar de ideia”.

Seja por sua carreira inserida em um meio predominantemente masculino, seja pelo divórcio quando esse processo ainda era um tabu ou pela viagem de jipe pelo Brasil estudando a cultura do país acompanhada apenas pelo cunhado e por um amigo, Inezita nunca seguiu o modelo esperado de mulher. Essa personalidade refletiu-se também na sua atuação junto da família.

Paula conta rindo de como Inezita fugia do tradicional papel de idosa comedida e pacata: “Lembro de uma vez quando meus filhos eram pequenos, 4 ou 5 anos, eu estava em São Paulo e liguei para ela, convidando para jantar. Ela escolheu ir num rodízio de churrasco. Uma senhora comendo rodízio no jantar durante a semana não é muito comum, mas era a minha avó, ela era assim mesmo. Minha surpresa veio com o horário: ‘Ah, venha me pegar umas 22h30, 23h’. Mudei os planos, né? Não levei meus filhos – que já estariam dormindo a essa hora. A resposta dela foi: ‘Sim, deixa as crianças em casa e vamos, temos mais tempo para conversar’. Isso foi há uns dez anos, ela já tinha seus 80 anos e não era nada do que se espera de uma avozinha”.

Em geral, o contato de Paula e seus filhos com Inezita era intenso. Viam-se toda semana, mas em vez do típico almoço de domingo eles se reuniam à noite na casa da neta para comer pizza. A avó chegava acompanhada do violão e cantava para os bisnetos a noite toda. A artista plástica ressalta que, apesar da morte, a figura de Inezita Barroso ainda é muito forte em sua família: “Meus filhos têm muitas memórias dela, já eram grandes quando ela faleceu. Um deles hoje toca guitarra (para desespero dela, eu imagino) e sempre fala coisas do tipo ‘Acho que a bisa é que me inspira a tocar’”.

A Ocupação Inezita Barroso, por coincidência, abre no dia do aniversário de Paula, 27 de setembro. Ao saber da data, a neta ri: “É minha avó mexendo os pauzinhos lá de cima”.

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Inezita aos 25 anos, em 1950 | foto: acervo pessoal

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Slides

Slides encontrados no acervo pessoal de Inezita Barroso, com registros feitos entre as décadas de 1950 e 1970, com familiares e em viagens | fotos: acervo pessoal

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Matriarca

Inezita Barroso com a filha Marta, as netas e os bisnetos | foto: Eduardo Campos/Cedoc TV Cultura