O professor cineasta

Acervo Centro Cultural São Paulo

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Um distinto professor estrangeiro no meio da sala de aula (Herbert Duschenes)

Por Martin Grossmann

São quase 40 anos que nos separam daquela sala onde Herbert Duschenes projetava seus filmes em super-8 nas aulas de história da arte e arquitetura que ministrava na Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), em São Paulo (SP). Muita coisa mudou de lá para cá, a começar pelo modo como documentamos e representamos o mundo no qual vivemos.

Herbert, ao viajar com Maria pelos quatro cantos do mundo nos anos 1970 e 1980, utilizava o  super-8 – formato de película cinematográfica com equipamentos de fácil manuseio –, lançado pela Kodak em 1965. Esse formato popularizou o registro e, subsequentemente, a reprodução de imagens em movimento antes mesmo do vídeo em VHS. Nessas ocasiões, Herbert também adquiria e captava material sonoro para ser utilizado em trilhas sonoras. O dinamismo e a diversidade de um mundo em transformação eram observados e gravados por esse espírito inquieto e audacioso em “multimídia”.

O artista em Herbert já notava que o mundo estava ficando cada vez mais complexo, mais imprevisível, mais multidimensional. Para esse singular professor de história da arte e da arquitetura, livros, apostilas e um projetor de slides já não eram suficientes. Os meios, os gêneros e as disciplinas em suas especificidades limitavam a percepção e a crítica e, portanto, era necessário desenvolver novas formas de registro e de exibição, novas metodologias, novas pedagogias.

Como transmitimos aos outros nossas experiências, nosso conhecimento? Existem modos específicos, protocolos, convenções e formatos que permitem  essa comunicação, mas dificilmente são questionados ou até renovados. Herbert e Maria estavam na vanguarda, adiantavam o devir! Apesar de aquela sala ser inadequada, quase insalubre, “ensanduichada” entre dois pisos do prédio principal da Faap, Herbert proporcionava aos quase 120 alunos ali reunidos verdadeiras viagens a outras paragens, a outros mundos – reais e imaginários.

Tal processo era conduzido, na sala, por uma mise-en-scène muito simples, mas muito bem planejada, composta de filmes (editados para cada ocasião) projetados na parede frontal, sempre acompanhados por inusitadas trilhas sonoras (em som estereofônico em caixas de som no fundo da sala) e por uma instigante narrativa, conduzidas por “um distinto senhor estrangeiro” sentado no meio da sala. Suas aulas eram assim, performáticas e espaciais.

Essa ambiência arquitetada por Herbert era capaz de nos transportar para além daquela sala, para além do exterior. Transportava-nos para um novo mundo, um mundo planetário, global! Sim, conhecemos a Europa, as grandes metrópoles do mundo desenvolvido; adentramos museus, a Documenta de Kassel, na Alemanha, a Bienal de Veneza, na Itália, e a de São Paulo, bem como outras importantes mostras internacionais de arte pelo mundo – mas também conhecemos a realidade das cidades, de alguns países, da relação/interação entre urbanismo, arquitetura e as artes em uma geopolítica e uma economia mundial em radical transformação.

E não era só isso: fomos também teletransportados para outros recantos do mundo, ainda hoje muito distantes do Brasil, como China, Japão, Bali, Vietnã, Camboja… A arte apresentada por Herbert em diferentes contextos e localidades não era só a arte de museus, galerias e bienais, mas uma arte em e de múltiplas dimensões, uma arte que transcendia os limites do entendimento tradicional da arte.

Por meio dessa mise-en-scène que Herbert proporcionava em suas aulas, a arte estava em toda parte e já não era somente multimeios, mas multimídia! Certamente essas aulas nos prepararam para este novo mundo no qual vivemos hoje – informado e estruturado pelas mídias e pela internet.

Martin Grossmann é formado em artes plásticas pela Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), onde, no final da década de 1970, foi aluno de Herbert Duschenes. Atuou ainda como monitor da disciplina, tornando-se, entre 1985 e 1987, professor assistente de Duschenes.

Fez mestrado na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP) e doutorado na Universidade de Liverpool, no Reino Unido. Foi diretor do Instituto de Estudos Avançados da USP (IEA/USP), diretor do Centro Cultural São Paulo (CCSP) e vice-diretor do Museu de Arte Contemporânea (MAC). Atualmente é professor titular da ECA/USP, integra a Comissão Científica da Academia Intercontinental e é o coordenador acadêmico da Cátedra Olavo Setubal de Arte, Cultura e Ciência.

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Para conhecer melhor Herbert Duschenes, seu método de ensino e seu olhar de cineasta, reunimos aqui alguns programas de aula do professor – que evidenciam a abrangência no seu ensino da história da arte – e trechos dos filmes gravados por ele em suas viagens. Nas fotos, ele sempre com a câmera em mãos, como uma extensão de seu corpo.

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Carta de interesse enviada a Faap

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A partir de 1967 Herbert deu aulas regulares na Fundação Armando Alvares Penteado (Faap) – onde lecionou por cerca de 30 anos – e pontuais em outras instituições, como o Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM/SP) e o Museu de Arte de São Paulo (Masp). Além disso começou, em 1976, a receber um grupo de alunos em sua casa, todos os domingos.

Durante o período em que lecionou, conhecer outras culturas passou a ser  parte importante da profissão de professor. Ao longo de sua atividade docente, Herbert percorreu vários locais da Europa, da Ásia, da África e da América.

Tanto em casa como nas aulas de graduação na Faap, ou ainda em cursos livres, a estrutura dos encontros que Herbert propunha era semelhante: exibia os filmes que ele mesmo produzia e editava em 8 mm ou super-8, acompanhados de músicas escolhidas especificamente para cada aula, com comentários seus ao longo da apresentação – a qual, em algumas ocasiões, era seguida de uma conversa.

Em seus filmes Herbert destacava tanto o que havia de mais inovador em arte e arquitetura contemporâneas – em visitas à Bienal de Veneza e à Documenta

de Kassel, entre outros eventos – quanto as heranças e os costumes de sociedades tradicionais. Viagens à Indonésia e ao Camboja, por exemplo, trouxeram imagens e ideias até então praticamente desconhecidas dos brasileiros. O pareamento entre esses tipos de conteúdo – o mais moderno da cultura ocidental e as manifestações populares – revelava um pensamento vanguardista e sofisticado para a época.

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Seção de vídeo

As aulas de Herbert – Ocupação Maria e Herbert Duschenes (2016)

A documentarista Paola Prestes e o professor Agnaldo Farias falam sobre suas experiências como ex-alunos de Herbert Duschenes.

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Cartão postal enviado pelos alunos a Herbert

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Venezia

Imagens registradas originalmente em super-8 por Herbert Duschenes.

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Vienna

Imagens registradas originalmente em super-8 por Herbert Duschenes.

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Programa de aula – A arte do Oriente

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Mapa desenhado por Herbert

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Seção de vídeo

Filmes e viagens de Herbert – Ocupação Maria e Herbert Duschenes (2016)

Ronaldo Duschenes, filho do casal Maria e Herbert Duschenes, o professor Agnaldo Farias e a documentarista Paola Prestes falam sobre o olhar de Herbert de media man e criador em suas aulas.

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Programa de aula – a história da arte e cultura Ocidental

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O mundo do Islã

Imagens registradas originalmente em super-8 por Herbert Duschenes.

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Peru / País dos Incas

Imagens registradas originalmente em super-8 por Herbert Duschenes.

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França Medieval

Imagens registradas originalmente em super-8 por Herbert Duschenes.

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